sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Miss A - Good-bye Baby


Cheguei cedo gente ^^. Decidi que vou ter que colocar, pelo menos, uma música por dia. Vou tentar postar filmes quase todos os dias ou semana. Os livros serão atualizados todo final de semana, juntamente com os animes. Sei que é meio chato ficar deixando recados assim numa publicação de música, mas é o jeito, não é?
Good-Bye Baby é mais uma música da girl band Miss A, outra das minhas bandas asiáticas favoritas. Meu amigo me enviou essa música no mês passado e decidi posta-la aqui. O ritmo é bem legal e o vídeo tem sua própria história. Achei até engraçado em algumas partes.
História resumidíssima da banda:  Miss A, originária da Coreia do Sul, é uma girl group criada pela JYP Entertainment pela sub-gravadora AQ Entertainment. Suas integrantes são Fei, Jia, Min e Suzy.  

Adeus Baby

Adeus baby, adeus. Dê meia volta e vá embora
Não diga nenhuma palavra, desapareça
Baby adeus, adeus
Meu nome não é Suzy, pare de me chamar assim
Eu deveria saber desde antes, mas eu quis acreditar em você o máximo que pude
Eu sei o quão imaturo você é, não chore em vão
Vou jogar fora todas as suas coisas. Parei de atuar agora
Adeus baby, adeus. Dê meia volta e vá embora
Não diga nenhuma palavra, desapareça
Baby adeus, adeus, era bom e divertido
Mas é o fim para nós dois
Seu show acabou agora, baby adeus, adeus
Todos meus amigos me avisaram e eu nunca escutei
Sabe por que eu posso realmente dizer se a maneira como você me olha é sincera ou não?
Sua atuação me surpreendeu
Fiquei tão surpresa, mas no fim eu percebi e parei de chorar
Adeus baby, adeus. Dê meia volta e vá embora
Não diga nenhuma palavra, desapareça
Baby adeus, adeus, era bom e divertido
Mas é o fim para nós dois
Seu show acabou agora, baby adeus, adeus
Não vai ter som de vencedor pra você mais
A cobra pulou o muro e me traiu vagarosamente
Foi incrível o show que tive que assistir, sem ter nem que comprar um ingresso
Eu não fiquei nesse lugar de graça, não. Mas agora, é adeus.
Fiquei tão supresa com sua excelente atuação
Ela era tão boa que me fez chorar
Adeus baby, adeus. Dê meia volta e vá embora
Não diga nenhuma palavra, desapareça
Baby adeus, adeus, era bom e divertido
Mas é o fim para nós dois, seu show acabou agora
Baby adeus, adeus









quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Henry - 1-4-3

Eu disse que ia fazer mais postagens sobre coreanos e japoneses, não disse? Pois bem, aqui tem mais uma. Não julguem, ok? Tem mais gente que gosta.

1-4-3
Quando estamos juntos, posso dizer só de olhar em seus olhos (Oh oh oh oh)
Quando eu voltar para casa, eu não sei o que dizer y-y-yeah
Tudo o que digo ainda é tão estranho seus textos ainda são muito difíceis
Eu abro o dicionário e abro por abrir, quero saber, quero saber, eu não sei
Estou enviando 1-4-3 Eu ainda não consigo expressar meus sentimentos com palavras whoa oh oh
Enviando 1-4-3, não é apenas um simples jogo de números
Eu te amo 1-4-3, você é 4-8-6 enviando 1-4-3, somos tão diferentes
Enviando 1-4-3 , ainda é difícil não é apenas um simples jogo de número 1-4-3
Meu coração bate por cada palavra sua, eu gaguejo, o que estou dizendo?
Eu pareço ruim porque eu continuo recebendo errado, por favor, conheço o meu coração, conheço o meu coração
Tudo o que digo ainda é tão estranho Seus textos ainda são muito difíceis
Eu abro o dicionário e abro por abrir, quero saber, quero saber, eu não sei
Estou enviando 1-4-3 Eu ainda não consigo expressar meus sentimentos com palavras whoa oh oh
Enviando 1-4-3, não é apenas um simples jogo de números woh oh oh
Eu te amo 1-4-3, você é 4-8-6 enviando 1-4-3 , somos tão diferentes
Enviando 1-4-3 , ainda é difícil não é apenas um simples jogo de número 1-4-3
Estou escrevendo 1-4-3 para a garota que eu estou amando mais
Quando eu estou falando com meus amigos oh, eu estou me gabando e sim, me orgulho
Vocês não conhecem esse tipo de amor
Mesmo que não faça planos, mesmo que falamos línguas diferentes ela é uma garota go que fura ao redor eu sei
Estou enviando 1-4-3 eu ainda não consigo expressar meus sentimentos com palavras whoa oh oh
Enviando 1-4-3, não é apenas um simples jogo de números woh oh oh
Eu te amo 1-4-3, você é 4-8-6 enviando 1-4-3, somos tão diferentes
Enviando 1-4-3, ainda é difícil não é apenas um simples jogo de número 1-4-3
Woh oh oh woh 1-4-3 1-4-3 yeah-aa-yeah
Não é apenas um simples jogo de números 1-4-3


Eu fui muito lerda pra descobrir o que significava 1-4-3, principalmente porque tava escrito do lado do título, praticamente como se fosse uma tradução dos números. Quase me soquei por perceber que fui tão idiota e burra. Bom... vamos logo ao significado, mas pra isso vou ter que explicar uma coisinha para vocês;
A maioria dos artistas asiáticos usa o inglês para ser o refrão - frase ou palavra, entenderam? - então, se você for de outro país que não tenha o inglês como língua oficial vai ser muito difícil.
1-4-3 = uma palavra de uma letra, outra de quatro letras e outra de três letras. Se prestarmos atenção percebemos que é I Love You. I-Love-You, 1-4-3. Entenderam? É, acho que sim.
Bom... só isso mesmo. Prestem bastante atenção na letra e em como Henry expressa seus sentimentos com simples frases. Tentem começar a se expressar assim, não guardem seus sentimentos, pode acabar machucando.





quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Shinhwa - This Love

Essa é uma das primeiras bandas sul-coreanas que eu conheci, e acho que ela merece ser a primeira das milhares de bandas sul-coreanas que eu vou falar aqui ^^
Shinhwa é uma banda sul-coreana que surgiu no ano de 1998, em vinte e quatro de março. É composta por seis membros e tem diversas músicas contagiantes.


This Love
A luz vermelha - neste tempo parado, só o seu perfume permanece
Como um sonho eu não estou acordando de, eu estou caindo mais e mais para você
A luz verde - eu tenho ficado louco, devo correr até você?
Meu coração parece que vai explodir, ele compete apenas para você
Como satélites e estrelas cadentes, como uma estrela que viu o sol
Que giram em torno de você, mas você está quente, eu me aproximo você
Finalmente, eu te seguro (segurando seu coração) e
Deslumbro como eu queimo
Vivemos por esse amor (nanana nana nanana)
Vivemos por esse amor (nanana nana nanana)
Vivemos por esse amor
A luz do fogo - o momento em que eu estou preso em seus olhos ardentes
Um beijo para você me acordar, eu me sinto como se eu pudesse ter o mundo inteiro
Como satélites e estrelas cadentes, como uma abelha que tem visto uma pétala de flor
Que giram em torno de você, eu me aproximo você sem hesitação
Finalmente, eu te seguro (segurando seu coração) e voar
Para o alto
Vivemos por esse amor (nanana nana nanana)
Vivemos por esse amor (nanana nana nanana)
Vivemos por esse amor
Eu não posso ter o suficiente
Eu não posso sair do seu amor
Em um piscar de olhos, eu estou ao seu lado
Quando nós nos beijamos, eu me sinto tão feliz
(Nós vivemos para este amor)
Eu sou uma estrela cadente dentro de um sistema solar chamado você, estou puxado para você, você é um buraco negro que eu não posso negar
É automático, sistemático, neste universo, estou puxado para você, você é um buraco negro que eu não posso negar
Toda vez que eu contar 1, 2, 3
O mundo que nos rodeia pára
Siga o som ritmado
Vivemos por esse amor (toda vez que eu contar 1, 2, 3)
Vivemos por esse amor (nosso sonho de amor sem fim)
Vivemos por esse amor
Em meus sonhos, quando estou acordado, estar sempre ao meu lado
Não tenha medo, segure a minha mão, eu vou te proteger


Amei tanto o clipe quanto a letra e o ritmo da música. Para mim, vale tanto o que a música quer dizer - no caso, a letra dela e o que ela transmite - quanto seu ritmo e suas sensações transpassadas através das batidas. 
É, ja percebi que costumo falar sobre muitas músicas que falam sobre o amor. Mas o que seria nossa vida sem ele? Seria apenas desilusão, quem sabe.. Mesmo sem que percebamos o amor nos move, ou para frente ou para trás, depende de suas escolhas.











domingo, 24 de novembro de 2013

Yuru Yuri - Episódio 07


Neon Lights - Demi Lovato

Nessa quinta, dia 21 de novembro, Demi Lovato lançou o vídeo de seu novo single, Neon Lights que é o terceiro single de seu último trabalho nomeado como Demi.
Com o vídeo podemos ver mais uma vez o poder que Demi está demonstrando nesse novo álbum através dos clips. Neste novo single ela aparece com efeitos incríveis de maquiagem fluorescente em uma boate noturna com algumas imagens dela semi nua em uma espécie de lago.
O vídeo é bem sensual, corpo com corpo, mãos nos cabelos tingidos de azul, efeitos fluorescente... Todos esses detalhes deixaram o clipe maravilhosamente incrível além da musica se bastante dançante. É uma ótima dica para levantar o astral, e se sentir poderosa(o) se inspirando na Demi.


Para quem ainda não assistiu ao vídeo:


Ailuj XD

sábado, 23 de novembro de 2013

Yuru Yuri - Episódio 06


American Horror Story

Titulo: American Horror Story/ História de horror Americana
Categoria: Serie
Gênero: Terror/Horror, Suspense
Ano: 2011
País: EUA
Geralmente, quando você esta começando a assistir uma série com terror em seu principal gênero, não espera encontrar uma morte justo nos primeiros quinze minutos do episódio um. Eu mesma achei diferente, tendo em mente que a maioria das séries gostam de desenvolver o assunto e o tema nos primeiros episódios, para depois deixarem mortes e mais mortes acontecerem. Veremos o mais rápido possível se conseguimos colocar os episódios aqui para vocês.

Heaven Knows - The Pretty Reckless

A música fora lançada em 19 de novembro e faz parte do novo álbum da banda The Pretty Reckless, Going to Hell onde a banda comenta que o álbum virá mais pesado do que o último, o Light Me Up. Heaven Knows e é o segundo single lançado de Going To Hell.
A música podemos dizer que é um pouco satânica, mas não perde o valor com o ritmo, as batidas e a harmonia da voz da Taylor Momsen. Eu gostei bastante da música e sou uma Zombie, uma fã de The Pretty Reckless e esse último álbum está vindo batendo todas as minhas expectativas assim como as de todos os fãs.
Letra e tradução da música:


Heaven Knows


Jimmy's in the back
With a pocket of high
If you listen close
You can hear him cry


Oh, oh, heaven knows
We belong way down below
Sing it
Oh, Lord, heaven knows
We belong way down below
Way down below
Way down below


Judy's on the front
Seat picking up trash
Living on the dough
Gonna make that cash


Won't be pretty,
Won't be sweet
She's just sitting here
On her feet


Sing it
Oh, Lord, heaven knows
We belong way down below
Go
Oh, Lord, heaven knows
We belong way down below
Sing
Oh, Lord tell us so
We belong way down below
Oh, Lord tell us so
We belong way down below
Way down below (x4)


I've got what it takes, man
I've seen better days
I've got a better ways, man
I know that I worth


One, two, three and four
The devil's knocking at your door
Caught in the eye of a dead man's wife
Show you life with your head up high
Now you're on your knees
With a head down low
Big mental, she wear it to go
Tell them it's good
Tell them ok
Don't do a Goddamn thing they say


Oh, Lord, heaven knows
We belong way down below
Oh, Lord, tell us
We belong way down below
Way down below(x4)

I've seen better ways, man
I know better ways
I've seen better days, man
I've got better days

Jimmy's in the back
With a pocket of high
If you listen close
You can hear the crying


Oh, Lord, heaven knows
We belong way down below
Oh Lord, tell us
We belong way down below
Oh Lord, heaven knows
We belong way down below
Oh Lord tell us
We belong way down below
Way down below...

Way down below, way down below
Way down below, way down below



O Céu sabe

Jimmy está no fundo com o bolso cheio de maconha
Se você escutar com atenção
Você pode ouvi-lo chorar


Oh Senhor, o céu sabe
Nosso lugar é bem lá embaixo
Cantem
Oh Senhor, o céu sabe
Nosso lugar é bem lá embaixo
Lá embaixo, lá embaixo


Judy está no banco da frente apanhando lixo Vivendo pelo dinheiro
Precisa conseguir aquela grana
Não vai ser bonita
Não vai ser amável
Ela está apenas em pé


Cantem
Oh Senhor, o céu sabe
Nosso lugar é bem lá embaixo
Vamos
Oh Senhor, o céu sabe
Nosso lugar é bem lá embaixo
Cante
Oh Senhor, nos diga
Nosso lugar é bem lá embaixo
Oh Senhor, nos diga
Nosso lugar é bem lá embaixo
lá embaixo (x4)


Tenho o que eu preciso, cara
Já vi dias melhores
Tenho jeitos melhores, cara
Eu sei que valho a pena


Um, dois, três e quatro
O diabo está batendo na sua porta
Pegando no olho da esposa de um homem morto
Te mostrando a vida com sua cabeça erguida
Agora você está de joelhos
Com a sua cabeça baixa
Grande demente, ela usará isso para ir
Diga a eles que isso é bom
Diga para eles que está tudo bem
Não faça nada do que eles disserem
Oh Senhor, nos diga
Nosso lugar é bem lá embaixo
Oh Senhor, nos diga
Nosso lugar é bem lá embaixo
Lá embaixo (x4)


Eu já vi jeitos melhores, homem
Eu conheço jeitos melhores
Eu já vi dias melhores, homem
Eu já tive dias melhores


Jimmy está no fundo com o bolso cheio de maconha
Se você escutar com atenção
Você pode ouvi-lo chorar


Oh Senhor, o céu sabe
Nosso lugar é bem lá embaixo
Oh Senhor, nos diga
Nosso lugar é bem lá embaixo
Oh Senhor, o céu sabe
Nosso lugar é bem lá embaixo
Oh Senhor, nos diga
Nosso lugar é bem lá embaixo
lá embaixo..

Lá embaixo, lá embaixo
Lá embaixo, lá embaixo


Fonte da letra e tradução: The Pretty Reckless Brasil 

Roqueiros espero que tenham gostado da dica e aqui está o vídeo áudio de Heaven Knows:



Ailuj XD 

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Dezesseis Luas

Titulo: Dezesseis Luas
Titulo original: Beautiful Creatures
Categoria: Filme
Gênero: Fantasia, Romance
Ano: 2013
Personagens principais: Ethan Wate(Alden Ehrenreich) e Lena Duchannes(Alice Englert)
Classificação de idade: 12 anos
Direção: Richard LaGravenese
País: EUA

Esse filme foi indicado por uma de minhas amigas. Ouvi falar que era uma cópia de Crepúsculo e isso me desanimou de assisti-lo. Bem... não me arrependi de o ter feito.
O filme fala sobre a história de Ethan e Lena, dois adolescentes que estudam no terceiro ano do ensino médio. Ethan se interessa rapidamente por Lena, cuja família tem fama de ser satanista. Será que eles vencerão a guerra para ficarem juntos? Lutarão contra a maldição pelo amor um do outro?




Capitulo seis – Minha transformação em senhor do banheiro.

Depois que assimilei o fato de meu professor de latim ser um cavalo, fizemos um passeio agradável, embora tivesse o cuidado de não andar atrás dele. Havia participado algumas vezes das rondas com pazinhas para recolher cocô de cachorro na Parada do Dia de Ação de Graças da loja Macy’s e, lamento dizer, não confiava na parte de trás de Quíron tanto quanto confiava na da frente.
Passamos pela quadra de vôlei. Diversos campistas se cutucavam. Um deles apontou para o chifre de minotauro que eu carregava. Um outro disse:
- É ele.
A maioria dos campistas era mais velha que eu. Seus amigos sátiros eram maiores que Grover, todos trotando de um lado para outro de camisetas cor de laranja do ACAMPAMENTO MEIO-SANGUE, sem nada para cobrir os traseiros peludos à mostra. Eu normalmente não era tímido, mas o modo como olhavam para mim me deixou pouco à vontade. Era como se esperassem que eu desse um salto mortal ou coisa assim.
Olhei para a casa de fazenda trás de mim. Era muito maior do que eu pensara - quatro andares, azul-céu com acabamento em branco, como um hotel de veraneio de primeira classe à beira-mar. Eu estava conferindo o cata-vento de latão em forma de águia no topo quando algo me chamou a atenção, uma sombra na janela mais alta do sótão. Alguma coisa havia mexido na cortina, só por um segundo, e tive a nítida impressão de que estava sendo observado.
- O que há lá em cima? - perguntei a Quíron. Ele olhou para onde eu estava apontando e seu sorriso desapareceu:
- Apenas o sótão.
- Mora alguém lá?
- Não - disse em tom definitivo. - Nem uma única coisa viva.
Tive a sensação de que ele falava a verdade. Mas também tinha certeza de que algo havia mexido naquela cortina.
- Venha, Percy - disse Quíron, o tom despreocupado agora um pouco forçado. - Há muito para ver. Caminhamos pelos campos de morangos, onde campistas colhiam alqueires de morangos enquanto um sátiro tocava uma melodia numa flauta de bambu. Quíron me contou que o acampamento cultivava uma bela safra para exportar para os restaurantes de Nova York e para o Monte Olimpo.
- Paga as nossas despesas - explicou. - E os morangos não exigem esforço quase nenhum.
Ele disse que o sr. D produzia esse efeito sobre plantas frutíferas: elas simplesmente enlouqueciam quando ele estava por perto. Funcionava melhor com as vinhas, mas o sr. D estava proibido de cultivá-las, portanto, em vez delas eles plantavam morangos. Observei o sátiro tocando a flauta. A música fazia com que filas de insetos saíssem dos canteiros de morangos em todas as direções, como se fugissem de um incêndio. Imaginei se Grover podia fazer esse tipo mágica com música. Imaginei se ainda estava dentro da casa, levando broncas do sr. D.
-Grover não vai ter muitos problemas, vai? - perguntei a Quíron. - Quer dizer... ele foi um bom protetor. Sem dúvida. Quíron suspirou. Tirou o casaco de tweed e jogou-o por cima do seu lombo de cavalo, como uma sela.
- Grover sonha alto , Percy. Talvez mais alto do que seria razoável. Para atingir seu objetivo, ele precisa primeiro demonstrar uma grande coragem tendo sucesso como guardião, encontrando um novo campista e trazendo-o em segurança à Colina Meio-Sangue.
- Mas ele fez isso!
- Eu poderia concordar com você - disse Quíron. - Mas não cabe a mim julgar. Dioniso e o Conselho dos Anciãos de Casco Fendido devem decidir. Receio que possam não ver essa missão como um sucesso. Afinal, Grover perdeu você em Nova York, há o desventurado... ahn... destino da sua mãe. E o fato de que Grover estava inconsciente quando você o arrastou até os limites da propriedade. O conselho pode questionar se isso demonstra alguma coragem da parte de Grover.
Eu quis protestar. Nada do que acontecera havia sido por culpa de Grover. Também me sentia muito, muito culpado. Se não tivesse escapado de Grover na estação de ônibus, ele poderia não ter se envolvido em encrenca. - Ele vai ter uma segunda chance, não vai? Quíron retraiu-se. Infelizmente aquela era a segunda chance de Grover, Percy. Além disso, o conselho não estava muito ansioso em lhe dar outra oportunidade depois do que aconteceu na primeira vez, cinco anos atrás.
- O Olimpo sabe, eu o aconselhei a esperar mais tempo antes de tentar de novo. Ele ainda é muito pequeno para a sua idade.
- Que idade ele tem?
- Ah, vinte e oito.
- O quê! E ainda está na sexta série?
- Os sátiros amadurecem no dobro do tempo dos seres humanos, Percy. Grover teve idade equivalente à de um aluno de escola secundária nos últimos seis anos.
- Que coisa horrível.
- De fato - concordou Quíron. - De qualquer modo, Grover está atrasado, mesmo pelos padrões de sátiro, e ainda não avançou muito em magia dos bosques. O pobre estava ansioso por perseguir o seu sonho. Talvez agora encontre alguma outra carreira...
- Isso não é justo! - disse eu. - O que aconteceu na primeira vez? Foi mesmo assim tão ruim?
Quíron desviou os olhos depressa.
- Vamos andando?
Mas eu ainda não estava pronto para mudar de assunto. Uma coisa me ocorrera quando Quíron falou sobre o destino de minha mãe, como se estivesse intencionalmente evitando a palavra morte. O princípio de uma ideia - uma pequenina e esperançosa chama - começou a se formar em minha cabeça.
- Quíron - disse eu. - Se os deuses, o Olimpo e tudo isso são reais...
- Sim, criança?
- Isso significa que o Mundo Inferior também é real?
A expressão de Quíron se fechou.
 - Sim, criança. - Ele fez uma pausa, como se estivesse escolhendo as palavras cuidadosamente. - Há um
lugar para onde vão os espíritos após a morte. Mas por ora... até que saibamos mais...eu recomendaria que tirasse isso de sua cabeça.
- O que quer dizer com "até que saibamos mais"?
- Venha, Percy. Vamos ver os bosques.
Quando nos aproximamos, me dei conta de como a floresta era enorme. Tomava pelo menos um quarto do vale, com árvores tão altas e largas que a impressão era de que ninguém entrara lá desde os nativos americanos. Quíron disse:
- Os bosques têm provisões, se você quiser tentar a sorte,
- Provisões de quê? – perguntei. - Armado com o quê?
- Você verá. O jogo Capture a Bandeira é na sexta-feira à noite. Você tem a sua própria espada e escudo?
- Minha própria...?
- Não - disse Quíron. - Não creio que tenha. Acho que o tamanho cinco vai servir. Mais tarde vou visitar o arsenal.
Quis perguntar que tipo de acampamento de verão tem um arsenal, mas havia muito mais a pensar, portanto o passeio continuou. Vimos a linha de tiro com arco-e-flecha, o lago de canoagem, os estábulos (dos quais Quíron parecia não gostar muito), a linha de lançamento de dardo, o anfiteatro para cantoria e a arena onde Quíron disse que eles realizavam lutas de espadas e lanças.
- Lutas de espadas e lanças? - perguntei.
- Desafios entre chalés e coisas assim - explicou ele. - Não são letais. Normalmente. Ah, sim, e há também o refeitório.
Quíron apontou para um pavilhão ao ar livre emoldurado por colunas gregas brancas sobre uma colina que dava para o mar. Havia uma dúzia de mesas de piquenique de pedra. Sem telhado. Sem paredes.
- O que vocês fazem quando chove? - perguntei.
Quíron me olhou como se eu tivesse ficado meio maluco.
- Ainda assim temos de comer, não temos?
Resolvi deixar para lá. Finalmente, ele me mostrou os chalés. Havia doze deles aninhados no bosque junto ao lago. Estavam dispostos em U, dois na frente e cinco enfileirados de cada lado. E eram, sem dúvida, o mais estranho conjunto de construções que já vi. A não ser pelo fato de cada um ter um grande número de latão acima da porta (ímpares do lado esquerdo, pares do direito), eram totalmente diferentes um do outro. O número 9 tinha chaminés como uma minúscula fábrica. O número 4 tinha tomateiros nas paredes e uma cobertura feita de grama de verdade. O 7 parecia feito de um ouro sólido que reluzia tanto à luz do sol que era quase impossível de se olhar. Todos davam para uma área comum mais ou menos do tamanho de um campo de futebol, pontilhada de estátuas gregas, fontes, canteiros de flores e um par de cestos de basquete (o que era mais a minha praia). No centro do campo havia uma enorme área de pedras com uma fogueira. Muito embora fosse uma tarde quente, o fogo ardia de modo lento. Uma menina com cerca de nove anos estava cuidando das chamas, cutucando os carvões com uma vara. O par de chalés à cabeceira do campo, números 1 e 2, pareciam mausoléus casadinhos, grandes caixas de mármore branco com colunas pesadas na frente. O chalé 1 era o maior e mais magnífico dos doze.
As portas de bronze polido cintilavam como um holograma, de tal modo que, vistas de ângulos diferentes, raios pareciam atravessá-las. O chalé 2 era de certo modo mais gracioso, com colunas mais finas encimadas com romãs e flores. As paredes eram entalhadas com imagens de pavões.
- Zeus e Hera? - adivinhei.
- Correto - disse Quíron.
- Os chalés parecem vazios.
- Diversos chalés estão vazios. è verdade. Ninguém jamais fica no 1 ou 2.
Certo. Então cada chalé tinha um deus diferente como mascote e chalés para os doze olimpianos. Mas por que alguns estariam vazios? Parei na frente do primeiro chalé da esquerda, o número 3. Não era alto e imponente como o chalé 1, mas comprido, baixo e sólido. As paredes externas eram de pedras cinzentas rústicas salpicadas de pedaços de conchas e coral, como se as pedras tivessem sido cortadas diretamente do fundo do oceano. Espiei para dentro da porta aberta e Quíron disse:
- Ih, eu não faria isso!
Antes que ele pudesse me puxar de volta, senti o odor salgado do interior, como o vento na praia de Montauk. As paredes internas brilhavam como madrepérola. Havia seis beliches vazios com lençóis de seda virados para baixo. Mas não havia indício de que alguém já tivesse dormido lá. O lugar parecia tão triste e solitário que fiquei contente quando Quíron pôs a mão no meu ombro.
- Vamos, Percy.
A maioria dos outros chalés estava abarrotada de campistas. O numero 5 era vermelho vivo - uma pintura muito malfeita, como se a cor tivesse sido jogada a esmo com baldes e mãos. O telhado era forrado de arame farpado. Uma cabeça de javali empalhada estava pendurada acima da porta e seus olhos pareciam me seguir. Dentro pude ver um bando de meninos e meninas mal-encarados, disputando queda-de-braço e discutindo enquanto o rock tocava às alturas. A mais barulhenta era uma menina de talvez treze ou quatorze anos. Usava uma camiseta do ACAMPAMENTO MEIO-SANGUE tamanho GGG embaixo de um casaco camuflado. Ela mirou em mim e lançou um maldoso olhar de desprezo. Fez lembrar Nancy Bobofit, só que a menina do acampamento era muito maior e de aparência mais cruel, seu cabelo era comprido, esticado e castanho, em vez de vermelho. Continuei andando, tentando ficar longe dos cascos de Quíron.
- Ainda não vimos os centauros – observei.
- Não - disse Quíron chateado. - Infelizmente, meus parentes são uma gente selvagem e bárbara. Você pode encontrá-los no mato ou em eventos desportivos importantes. Mas não verá nenhum aqui.
- Você disse que seu nome é Quíron. Você é mesmo...
Ele sorriu para mim.
- O Quíron das histórias? Instrutor de Hércules e tudo aquilo? Sim, Percy, eu sou.
- Mas você não devia estar morto?
Quíron fez uma pausa, como se a pergunta o intrigasse.
- Honestamente, não sei nada sobre devia. A verdade é que eu não posso estar morto. Entenda, há muitas eras os deuses concederam meu desejo. Pude continuar o trabalho que adorava. Pude ser um mestre de heróis enquanto a humanidade precisasse de mim. Ganhei muito com aquele desejo... e renunciei a muito. Mais ainda estou aqui, portanto só posso presumir que ainda sou necessário. Pensei sobre ser um professor de três mil anos. Isso não estaria na minha lista das Dez Coisas Mais Desejadas.
- Isso nunca fica chato?
- Não, não - disse ele. - Horrivelmente deprimente às vezes, mas nunca chato.
- Por que deprimente?
Quíron pareceu ficar com alguma deficiência auditiva de novo.
- Ah, olhe - disse ele. - Annabeth está esperando por nós.
*****
 A menina loira que eu conhecera na Casa Grande estava lendo um livro na frente do último chalé da esquerda, o número 11. Quando nos aproximamos, ela olhou para mim com um ar crítico, como se ainda estivesse pensando em como eu babava. Tentei ver o que ela estava lendo, mas não consegui distinguir o título. Achei que fosse minha dislexia em ação. Então me dei conta de que o título não era sequer em inglês. As letras pareciam grego para mim. Quer dizer, literalmente grego. Havia figuras de templos e estátuas e diferentes tipos de colunas, como em um livro de arquitetura.
- Annabeth - disse Quíron - eu tenho aula de arco-e-flecha para mestres ao meio-dia. Você cuidaria de Percy a partir daqui?
- Sim, senhor.
- Chalé 11 - disse Quíron para mim, fazendo um gesto em direção à porta. - Sinta-se em casa.
Entre todos os chalés, o 11 era o que mais parecia um velho chalé comum de acampamento de verão, com ênfase no velho. A soleira estava desgastada, a pintura marrom, descascando. Acima do vão da porta havia um daqueles símbolos de médico, um bastão alado com duas serpentes enroscadas nele. Como é mesmo que chamavam aquilo...? Um caduceu. Dentro, estava abarrotado de gente, meninos e meninas, em muito maior número que os beliches. Sacos de dormir estavam espalhados por todo piso. Parecia um ginásio onde a Cruz Vermelha estabelecera um centro de refugiados. Quíron não entrou. A porta era muito baixa para ele. Mas quando os campistas o viram, todos se puseram em pé e fizeram uma reverência respeitosa.
- Então tudo bem - disse Quíron. - Boa sorte, Percy. Vejo você no jantar.
Ele partiu a galope ruma à linha de arco-e-flecha. Fiquei em pé no vão da porta, olhando para a garotada. Não estavam mais se curvando. Olhavam para mim, medindo-me com os olhos. Conheço essa rotina. Havia passado por ela em muitas escolas.
- Tudo bem? - instigou Annabeth. - Vá em frente.
Então, naturalmente, tropecei ao passar pela porta e fiz um completo papel de bobo. Houve algumas risadinhas dos campistas, mas nenhum deles disse nada. Annabeth anunciou:
- Percy Jackson, apresento-lhe o chalé 11.
- Normal ou indeterminado? - perguntou alguém.
Eu não sabia o que dizer, mas Annabeth disse:
- Indeterminado. Todos gemeram. Um cara que era um pouco mais velho que o restante chegou para frente. - Vamos, vamos, campistas. É para isso que estamos aqui. Bem-vindo, Percy. Você pode ficar com aquele ponto no chão logo ali.
O cara tinha cerca de dezenove anos e parecia muito legal. Era alto e musculoso, com cabelo com cor de areia aparado curto e um sorriso amigável. Usava uma camiseta regata laranja, calças cortadas, sandálias e um colar de couro com cinco contas de argila em cores diferentes. A única coisa perturbadora na sua aparência era uma grossa cicatriz branca que corria desde logo abaixo do olho direito até o queixo, como um antigo corte de faca.
- Este é Luke - disse Annabeth, e sua voz pareceu mudar um pouco. Dei uma olhada nela e poderia ter jurado que estava ficando vermelha. Ela me viu olhando e sua expressão endureceu de novo. - Ele é seu conselheiro por enquanto.
- Por enquanto? - perguntei.
- Você é indeterminado - explicou Luke pacientemente. - Eles não sabem em que chalé acomodá-lo, então você está aqui. O chalé 11 recebe todos os recém-chegados, todos os visitantes. Naturalmente Hermes, nosso patrono, é o deus dos viajantes.
Olhei para o minúsculo espaço de chão que eles me deram. Eu não tinha nada para pôr ali e marcá-lo como meu, nenhuma bagagem, nenhuma roupa, nenhum saco de dormir. Apenas o chifre do Minotauro. Pensei em colocá-lo ali, mas então lembrei que Hermes era também o deus dos ladrões. Corri os olhos pelos rostos dos campistas, alguns mal-humorados e desconfiados, outros com um sorriso idiota, alguns me olhando como se esperassem uma oportunidade de limpar os meus bolsos.
- Quanto tempo vou ficar aqui? - perguntei.
- Boa pergunta - disse Luke. - Até você ser determinado.
- Quanto tempo isso vai levar? Todos os campistas riram.
- Venha - disse Annabeth. - Vou lhe mostrar o pátio de vôlei.
- Eu já vi. - Venha. Ela agarrou meu pulso e me arrastou para fora. Pude ouvir o pessoal do chalé dando risadas atrás de mim.
*****
Quando estávamos a poucos metros de distancia, Annabeth disse:
- Jackson, você precisa fazer melhor do que isso.
- O quê?
Ela revirou os olhos e murmurou baixinho:
- Não posso acreditar que achei que você fosse o cara.
- Qual é o seu problema? - Eu agora estava ficando zangado. - Tudo o que sei é que matei um sujeito-touro...
- Não fale assim! - disse Annabeth. - Você sabe quantos neste acampamento gostariam de ter tido a sua chance?
- De ser mortos?
- De enfrentar o Minotauro! Para que você acha que nós somos treinados?
Eu sacudi a cabeça.
- Olhe, se a coisa contra a qual eu lutei era realmente o Minotauro, o mesmo das histórias... - Sim. - Então só existe um.
- Sim.
- E ele morreu, tipo um zilhão de anos atrás, certo? Teseu o matou no labirinto. Portanto...
- Monstros não morrem, Percy. Eles podem ser mortos. Mas eles não morrem.
- Ah, obrigado. Agora entendi tudo.
- Eles não têm alma, como você e eu. Você pode bani-los por algum tempo, talvez até por todo uma vida, se tiver sorte. Mas eles são forças primitivas. Quíron os chama de arquétipos. No fim, eles se reconstituem.
Pensei na sra. Dodds.
- Você quer dizer que se eu matei um, acidentalmente, com uma espada....
- A Fúr... Quer dizer, a sua professora de matemática. Está certo. Ela ainda está lá fora. Você apenas a deixou muito, muito zangada.
- Como você sabe da sra. Dodds?
- Você fala dormindo.
 - Você quase a chamou de alguma coisa. Uma Fúria? Elas são torturadoras de Hades, certo?
Annabeth olhou nervosamente para o chão, como se esperasse que ele se abrisse e a engolisse.
- Você não deve chamá-las pelo nome, mesmo aqui. Se acabamos tendo de falar nelas, nós as achamos de as Benevolentes.
- Puxa, existe alguma coisa que se possa dizer sem que haja trovões? - Eu soei reclamão, até para mim mesmo, mas naquele momento não me importei.
- Por que tenho de ficar no chalé 11, afinal? Por que fica todo mundo amontoado? Há uma porção de beliches vazios logo ali.
Apontei para os primeiros chalés e Annabeth empalideceu.
- A gente não escolhe simplesmente um chalé, Percy. Depende de quem são seus progenitores. Ou... o seu progenitor. Ela olhou fixamente para mim, esperando que eu entendesse.
- Minha mãe é Sally Jackson - disse eu. - Trabalha na doceria da Grande Estação Central. Pelo menos trabalhava.
- Sinto muito pela sua mãe, Percy. Mas não é isso que eu quis dizer. Estou falando sobre seu outro progenitor. Seu pai.
- Ele está morto. Não cheguei a conhecê-lo.
 Annabeth suspirou. Era claro que já tivera aquela conversa com outras crianças:
- Seu pai não está morto, Percy.
- Como pode dizer isso? Você o conhece?
- Não, é claro que não.
- Então como você pode dizer...
- Porque eu conheço você. Você não estaria aqui se não fosse um de nós.
- Você não sabe nada a meu respeito.
- Não? - Ela ergueu uma sobrancelha. - Aposto que você ficou passando de escola em escola. Aposto que foi expulso de uma porção delas.
- Como...
- Teve diagnóstico de dislexia. Provavelmente transtorno do déficit de atenção também.
Tentei engolir meu constrangimento.
- O que isso tem a ver?
- Tudo junto, é quase um sinal certo. As letras flutuam para fora da página quando você lê, certo? Isso é porque a sua mente está fisicamente programada para o grego antigo. E o transtorno do déficit de atenção... você é impulsivo, não consegue ficar quieto na classe. Isso são os seus reflexos de campo de batalha. Numa luta real, eles o manterão vivo. Quanto aos problemas de atenção, isso é porque enxerga demais, Percy, e não de menos. Seus sentidos são mais aprimorados que os de um mortal comum. É claro que os professores querem que você seja medicado. Eles são em maioria monstros. Não querem que você os veja como são.
- Você parece... você passou pelas mesmas coisas?
- A maioria das crianças daqui passou. Se você não fosse um de nós, não poderia ter sobrevivido ao Minotauro, e muito menos à ambrosia e ao néctar.
- Ambrosia e néctar.
- A comida e a bebida que estávamos dando a você para curá-lo. Aquilo teria matado um garoto normal. Teria transformado seu sangue em fogo e seus ossos em areia e você estaria morto. Encare os fatos. Você é um meio-sangue.
Um meio-sangue. Minha cabeça estava girando com tantas perguntas que eu não sabia por onde começar. - Ora, ora! Um novato! Eu dei uma olhada. A menina grandalhona do chalé feio e vermelho vinha andando lentamente em nossa direção. Havia três outras meninas atrás dela, todas grandes, feias e de aparência malvada como ela, todas usando casacos camuflados.
- Clarisse - suspirou Annabeth -, por que você não vai polir sua lança ou coisa assim?
- Claro, srta. Princesa - disse a grandalhona. - Para poder atravessar você com ela na sexta-feira à noite.
- Erre es korakas! - disse Annabeth, o que eu de algum modo entendi que era ―Vá para os corvos!‖ em grego, embora tivesse a sensação de que devia ser uma praga pior do que parecia. - Você não tem chance. - Vamos transformá-la em pó - disse Clarisse, mas seu olho se crispou. Talvez ela não tivesse certeza de poder cumprir a ameaça. Voltou-se para mim. - Quem é esse nanico?
- Percy Jackson - disse Annabeth -, esta é Clarisse, filha de Ares. Eu pisquei.
- Tipo... o deus da guerra? Clarisse sorriu desdenhosa.
- Você tem algum problema com isso?
- Não - disse eu, recobrando minha presença de espírito. - Isso explica o mau cheiro. Clarisse rosnou.
- Nós temos uma cerimônia de iniciação para novatos, Persiana. - Percy. - Seja o que for. Venha, vou lhe mostrar.
- Clarisse... - Annabeth tentou dizer.
- Fique fora disso, espertinha.
Annabeth pareceu ofendida, mas ficou de fora, e eu realmente não queria a ajuda dela. Eu era o novato. Tinha de construir minha própria reputação. Entreguei a Annabeth meu chifre de minotauro e me preparei para a luta, mas antes que eu percebesse Clarisse tinha me segurado pelo pescoço e me arrastava na direção de um edifício de blocos de concreto que percebi imediatamente que era o banheiro. Eu chutava e dava murros no ar. Já tinha estado em muitas brigas antes, mas aquela Clarisse grandalhona tinha mãos de ferro. Arrastou-me para dentro do banheiro das meninas. Havia uma fileira de vasos sanitários de um lado e uma fileira de chuveiros do outro. Cheirava como qualquer banheiro público, e eu estava pensando - tanto quanto podia pensar com Clarisse me arrancando os cabelos - que se aquele lugar pertencia aos deuses, eles deviam poder comprar privadas melhores.
As amigas de Clarisse estavam todas rindo, e eu tentava encontrar a força que usara para enfrentar o Minotauro, mas ela simplesmente não estava lá. - Como se ele fosse dos
―Três Grandes‖ - disse Clarisse, me empurrando em direção a um dos vasos. - Certo. O Minotauro provavelmente caiu na risada, de tão bobo que ele parecia. As amigas abafaram o riso. Annabeth ficou no canto, observando através dos dedos. Clarisse me forçou sobre os joelhos e começou a empurrar minha cabeça para dentro do vaso sanitário, que fedia a canos enferrujados e, bem, ao que vai para dentro de vasos sanitários. Fiz esforço para manter a cabeça erguida. Estava olhando para a água imunda e pensando: eu não vou enfiar a cabeça naquilo. Não vou. Então algo aconteceu. Senti uma pressão violenta na boca do estômago. Ouvi os encanamentos roncando, os canos estremeceram. A mão de Clarisse no meu cabelo afrouxou. A água pulou para fora do vaso, formando um arco por cima da minha cabeça, e em seguida me vi estatelado sobre os ladrilhos do piso do banheiro com Clarisse berrando atrás de mim. Eu me virei bem no momento em que a água explodiu para fora do vaso outra vez, atingindo Clarisse bem no rosto com tanta força que a fez cair de traseiro no chão. A água continuou jorrando em cima dela como o jato de uma mangueira de incêndio, empurrando-a para trás, para dentro de um boxe de chuveiro. Ela se debateu, esbaforida, e as amigas começaram a ir em sua direção. Mas então os outros vasos também explodiram, e mais seis jorros de água de privada as empurravam de volta. Os chuveiros também entraram em ação e, em conjunto, todos os dispositivos lançaram as meninas camufladas para fora do banheiro, fazendo-as rodopiar como pedaços de lixo sendo removidos com jatos d’água. Assim que elas foram postas porta afora, sentia a pressão nas minhas entranhas se aliviar, e a água parou de jorrar tão depressa quanto começara. O banheiro inteiro estava inundado. Annabeth não tinha sido poupada. Estava toda molhada e pingando, mas não fora empurrada para fora. Estava de pé exatamente no mesmo lugar me olhando em estado de choque. Olhei para baixo e me dei conta de que estava sentado no único ponto seco em todo o recinto. Havia um círculo de piso seco em volta de mim. Não havia nem uma gota d’água nas minhas roupas. Nada. Levantei com as pernas trêmulas. Annabeth disse: - Como você... - Eu não sei. Caminhamos até a porta. Do lado de fora, Clarisse e as amigas estavam prostadas na lama e um bando de outros campistas se reunira em volta para olhar, perplexos. O cabelo de Clarisse estava colado no rosto. O casaco camuflado estava encharcado e ela cheirava a esgoto. Ela me lançou um olhar de ódio absoluto. - Você está morto, novato. Está totalmente morto. Talvez eu devesse ter deixado pra lá, mas disse: - Quer gargarejar com água da privada de novo, Clarisse? Cale essa boca. As amigas tiveram de segurá-la. Arrastaram-na para o chalé 5, enquanto os outros campistas abriam caminho para evitar seus membros que esperneavam.
Annabeth olhou para mim. Eu não sabia dizer se ela estava apenas enjoada ou zangada comigo por encharcá-la.
- O que foi? - perguntei. - O que está pensando?
- Estou pensando - disse ela - que quero você no meu time para capturar a bandeira.

Yuru Yuri - Ep 05


segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Capitulo cinco – Eu jogo pinoche com um cavalo

Tive sonhos estranhos, cheios de animais de estábulos. A maioria queria me matar. O restante queria comida.
Devo ter acordado várias vezes, mas o que ouvi e vi não fazia sentido, então adormecia de novo. Lembro-me de estar deitado em uma cama macia, sendo alimentado com colheradas de alguma coisa que tinha gosto de pipoca com manteiga, só que era pudim. A menina com o cabelo loiro encaracolado pairava acima de mim com um sorriso afetado enquanto limpava as gotas de meu queixo com a colher.
Quando ela viu meus olhos abertos, perguntou:
- O que vai acontecer no solstício de verão?
Eu consegui resmungar:
- O quê?
Ela olhou em volta, como se estivesse com medo de que alguém ouvisse.
- O que está acontecendo? O que foi roubado? Nós só temos algumas semanas!
- Desculpe - murmurei. - Eu não...
Alguém bateu à porta, e a menina rapidamente encheu minha boca de pudim.
Quando acordei novamente, a menina tinha ido embora.
Um sujeito loiro e forte, como um surfista, estava no canto do quarto me vigiando. Tinha olhos azuis - pelo menos uma dúzia deles - nas bochechas, nas testas, nas costas das mãos.
*****
Quando finalmente voltei a mim de vez, não havia nada de estranho com o lugar ao meu redor, a não ser que era mais agradável do que eu estava acostumado. Estava sentado numa espreguiçadeira em uma enorme varanda, olhando ao longo de uma campina para colinas verdejantes à distância. A brisa tinha cheiro de morangos. Havia uma manta sobre as minhas pernas, um travesseiro atrás do pescoço. Tudo isso era ótimo, mas minha boca me dava a sensação de ter sido usada como ninho por um escorpião. A língua estava seca e pegajosa, e todos os dentes doíam. Sobre a mesa ao lado havia bebida num copo alto. Parecia suco de maçã gelado, com um canudinho verde e um guarda-chuva de papel enfiado em uma cereja.
Minha mão estava tão fraca que quase derrubei o copo quando passei os dedos em volta dele.
- Cuidado - disse uma voz familiar.
Grover estava apoiado no gradil da varanda, e parecia não dormir havia uma semana. Embaixo de um braço, segurava uma caixa de sapatos. Estava usando jeans, tênis de cano alto Converse e uma camiseta laranja-claro com os dizeres ACAMPAMENTO MEIO-SANGUE. Apenas o velho Grover. Não menino-bode.
Quem sabe não tive um pesadelo? Talvez minha mãe estivesse bem. Ainda estávamos de férias e tínhamos parado ali naquela grande casa por alguma razão. E...
- Você salvou minha vida - disse Grover. - Eu... bem, o mínimo que eu podia fazer... voltei na colina. Achei que você poderia querer isso.
Reverentemente, ele colocou a caixa de sapatos em meu colo.
Dentro havia um chifre de touro branco-e-preto, a base irregular por ter sido quebrada, a ponta salpicada de sangue seco. Não tinha sido um pesadelo.
- O Minotauro - disse eu.
- Ahn, Percy, não é uma boa idéia...
- É assim que o chamam nos mitos gregos, não é? - perguntei. - O Minotauro. Meio homem, meio touro.
Grover mudou de posição, pouco à vontade.
- Você ficou desacordado por dois dias. Do que se lembra?
- Minha mãe. Ela está mesmo...
Ele abaixou os olhos.
Olhei ao longo da campina. Havia pequenos bosques, um riacho sinuoso, campos de morangos espalhados embaixo do céu azul. O vale era cercado por colinas ondulantes, e a mais alta, bem na nossa frente, era a que tinha o grande pinheiro no topo. Mesmo isso parecia bonito à luz do sol.
Minha mãe se fora. O mundo inteiro deveria estar escuro e frio. Nada devia parecer bonito.
- Desculpe - fungou Grover. - Eu sou um fracasso. Eu... sou o pior sátiro do mundo.
Ele gemeu, batendo o pé com tanta força que ele saiu, quer dizer, o tênis Converse saiu. Dentro, estava recheado de isopor, a não ser por um buraco em forma de casco.
- Oh, Styx! - murmurou ele.
Um trovão ecoou no céu claro.
Enquanto ele lutava para pôr o casco de volta no falso pé, pensei: Bem, isso resolve as coisas.
Grover era um sátiro. Podia apostar que, se raspasse o cabelo castanho cacheado, encontraria pequenos chifres em sua cabeça.
Mas eu me sentia infeliz demais para me importar com a existência de sátiros ou mesmo minotauros. O importante era que minha mãe realmente tinha sido espremida para o nada, dissolvida em luz amarela.
Eu estava sozinho. Um órfão. E teria de viver com... Gabe Cheiroso? Não. Isso jamais iria acontecer. Preferia viver nas ruas. Fingiria ter dezessete anos e me alistaria no exercito. Faria alguma coisa.
Grover ainda estava fungando. O pobre garoto - pobre bode, ou sátiro, ou o que for - parecia estar esperando levar um murro.
- Não foi sua culpa - disse eu.
- Foi, sim. Eu devia protegê-lo.
- Minha mãe pediu para você me proteger?
- Não. Mas é isso que faço. Sou um guardião. Pelo menos... eu era.
- Mas por que...
De repente senti uma vertigem, minha visão rodando.
- Não se esforce demais - disse Gover. - Aqui.
Ele me ajudou a segurar o copo e eu levei o canudinho aos lábios.
Recuei com o gosto, porque estava esperando suco de maçã. Não tinha nada a ver com isso. Era gosto de biscoito com pedacinhos de chocolate. Biscoito líquido. E não qualquer biscoito - os biscoitos azuis da minha mãe com pedacinhos de chocolate, amanteigados e quentes, o chocolate ainda derretendo. Ao beber aquilo, meu corpo inteiro se sentiu bem, aquecido e cheio de energia. Minha tristeza não foi embora, mas era como se minha mãe tivesse acabado de acariciar minha bochecha e me dar um biscoito, como costumava fazer quando eu era pequeno, e tivesse dito que tudo ia ficar bem.
Antes de me dar conta, já tinha esvaziado o copo inteiro. Olhei para dentro dele e, com certeza, não era uma bebida quente, pois os cubos de gelo não tinham nem derretido.
- Estava bom? - perguntou Grover.
Fiz que sim com a cabeça.
- Que gosto tinha?
Ele pareceu tão suplicante que me senti culpado.
- Desculpe. Devia ter deixado você provar.
Os olhos deles se arregalaram.
- Não! Não foi isso que eu quis dizer. Eu só... fiquei curioso.
- Biscoitos com pedacinhos de chocolate - disse eu. - Os da minha mãe. Feitos em casa.
Ele suspirou.
- E como se sente?
- Como se fosse capaz de jogar Nancy Bobofit a cem metros de distancia.
- Isso é bom - disse ele. - Isso é bom. Não acho que você deva se arriscar a tomar mais disso aí.
- O que quer dizer?
Ele pegou meu copo com cautela, como se fosse dinamite, e o colocou de volta na mesa.
- Vamos. Quíron e o sr. D estão esperando.
*****
A varanda circundava toda a casa da fazenda.
Senti as pernas tremulas tentando andar toda aquela distancia. Grover se ofereceu para carregar o chifre do Minotauro, mas eu me agarrei a ele. Tinha pago um preço alto por aquele suvenir. Não iria largá-lo.
Quando demos a volta até o lado oposto da casa, parei para recuperar o fôlego.
Devíamos estar na costa norte de Long Island, porque daquele lado da casa o vale seguia até a água, que cintilava a cerca de um quilômetro de distancia. Entre a casa e lá, eu simplesmente não consegui processar tudo o que estava vendo. A paisagem era pontilhada de construções que lembravam a arquitetura grega antiga - um pavilhão a céu aberto, um anfiteatro, uma arena circular - só que pareciam novos em folha, as colunas de mármore branco reluzindo ao sol. Em uma quadra de areia próxima, uma dúzia de crianças e sátiros jogavam voleibol. Canoas deslizavam por um pequeno lago. Crianças de camiseta laranja-clara como a de Grover acorriam umas atrás das outras em volta de um grupamento de chalés no meio do bosque. Algumas praticavam arco-e-flecha em alvos. Outras montavam cavalos em uma trilha arborizada e, a não ser que eu estivesse tendo alucinações, alguns cavalos tinham asas.
Na extremidade da varanda, dois homens estavam sentados frente a frente em uma mesa de carteado. A menina de cabelos loiros que me alimentara com colheradas de pudim com sabor de pipoca estava apoiada no gradil da varanda, ao lado deles.
O homem de frente para mim era pequeno, mas gorducho. Tinha nariz vermelho, grandes olhos chorosos e cabelo cacheado tão preto que era quase roxo. Parecia uma daquelas pinturas de anjos-bebês, como se chamam mesmo... surubins? Não, querubins. É isso. Ele parecia um querubim que chegou a meia idade em um acampamento de trailers. Usava uma camisa havaiana com estampa de tigres e teria se encaixado perfeitamente em uma das rodas de pôquer de Gabe, só que eu tive a sensação de que esse cara poderia ter ganhado até do meu padrasto.
Aquele é o sr. D - murmurou Grover para mim. - Ele é o diretor do acampamento. Seja educado. A menina é Annabeth Chase. Ela é só uma campista, mas está aqui há mais tempo que quase todo mundo. E você já conhece Quíron...
Ele apontou para o cara que estava de costas para mim.
Primeiro, percebi que ele estava sentado em uma cadeira de rodas. Depois reconheci o casaco de tweed, o cabelo castanho ralo, a barba desalinhada.
- Sr. Brunner! - exclamei.
O professor de latim voltou-se e sorriu para mim. Os olhos estavam com aquele brilho travesso de quando ele fazia uma prova-surpresa e todas as respostas da múltipla escolha eram B.
- Ah, bom, Percy - disse ele. - Agora já temos quatro para o pinoche.
Ele me ofereceu uma cadeira à direita do sr. D, que olhou para mim com olhos injetados e soltou um grande suspiro.
- Ah, suponho que devo dizer isto. Bem-vindo ao Acampamento Meio-Sangue. Pronto. Agora, não espere que eu esteja contente em vê-lo.
- Ahn, obrigado. - Logo me afastei um pouco dele, porque, se havia uma coisa que eu tinha aprendido com Gabe era reconhecer quando um adulto andou tomando umas e outras. Se o sr. D era abstêmio, eu era um sátiro.
- Annabeth? - o sr. Brunner chamou a menina loira.
Ela avançou e o sr. Brunner nos apresentou.
- Esta mocinha cuidou de você até que ficasse bom, Percy. Annabeth, minha querida, por que não vai verificar o beliche de Percy? Vamos instalá-lo no chalé 11 por enquanto.
Annabeth disse:
- Claro, Quíron.
Ela provavelmente tinha a minha idade, talvez fosse uns cinco centímetros mais alta, e tinha a aparência muitíssimo mais atlética.
Com seu bronzeado intenso e o cabelo loiro cacheado, era quase exatamente como eu imaginava uma típica menina da Califórnia, a não ser pelos olhos, que arruinavam essa imagem. Era surpreendentemente cinzentos, como nuvens de tempestade; bonito, mas também intimidadores, como se ela estivesse analisando o melhor modo de me derrubar em uma luta.
Ela deu uma olhada no chifre de minotauro em minhas mãos, então de novo para mim. Imaginei que fosse dizer: Você matou um minotauro! Ou Uau, você é tão assustador! Ou algo do tipo. Em vez disso, ela disse:
- Você baba quando está dormindo!
Depois saiu correndo pelo gramado, os cabelos loiros esvoaçando atrás dela.
- Então - disse, ansioso por mudar de assunto -, o senhor, ahn, trabalha aqui, sr. Brunner?
- Sr. Brunner não - disse o ex-sr. Brunner. - Lamento, era pseudônimo. Você pode me chamar de Quíron.
- Combinado. - Totalmente confuso, olhei para o diretor. - E sr. D... significa alguma coisa?
O sr. D parou de embaralhar as cartas. Olhou para mim como se eu tivesse acabado de arrotar alto.
- Rapazinho os nomes são coisas poderosas. Você simplesmente não sai por aí os usando sem motivo.
- Ah. Certo. Desculpe.
- Devo dizer, Percy - interrompeu o Quíron-Brunner -, que estou contente em vê-lo com vida. Já faz um bom tempo desde que fiz um atendimento domiciliar a um campista em potencial. Detestaria pensar que tinha perdido meu tempo.
- Atendimento domiciliar?
- O ano que passei na Academia Yancy para instruí-lo. Temos sátiros de prontidão na maioria das escolas, é claro. Mas Grover me alertou assim que o conheceu. Ele sentiu que você era especial, então decidi ir lá. Convenci o outro professor de latim a... ah, tirar uma licença.
Tentei me lembrar do começo do ano escolar. Parecia tanto tempo atrás, mas eu tinha uma vaga lembrança de outro professor de latim na minha primeira semana em Yancy. Então, sem explicação, ele desapareceu e o sr. Brunner assumiu a turma.
- Você foi a Yancy só para me ensinar? - perguntei.
Quíron assentiu.
- Honestamente, de inicio eu não tinha muita certeza a seu respeito. Contatamos a sua mãe, informamos que estávamos de olho em você, para o caso de estar pronto para o Acampamento Meio-Sangue. Mas você ainda tinha muito a aprender. Não obstante, chegou aqui vivo, e esse é sempre o primeiro teste.
- Grover - disse o sr. D com impaciência -, vai jogar ou não?
- Sim, senhor! - Grover tremeu quando se sentou na quarta cadeira, embora eu não soubesse por que ele deveria ter tanto medo de um homenzinho gorducho de camisa havaiana com estampa de tigre.
- Você sabe jogar pinoche? - indagou o sr. D olhando para mim com desconfiança.
- Infelizmente não - disse eu.
- Infelizmente não, senhor - disse ele.
- Senhor - repeti. Estava gostando cada vez menos do diretor do acampamento.
- Bem - ele me disse -, este é, juntamente com as lutas de gladiadores e o Pac-Man, um dos melhores jogos já inventados pelos seres humanos. Imaginava que todos os jovens civilizados conhecessem as regras.
- Estou certo de que o menino pode aprender - disse Quíron.
- Por favor - disse eu. -, o que é este lugar? O que estou fazendo aqui? Sr. Brun... Quíron, por que iria à Academia Yancy só para me ensinar?
O sr. D bufou.
- Fiz a mesma pergunta.
O diretor do acampamento deu as cartas. Grover se encolhia a cada vez que uma caía na sua pilha.
Quíron sorriu para mim de um modo compreensivo, como costumava fazer na aula de latim, como para me dizer que qualquer que fosse minha nota, eu era seu aluno mais importante. Ele esperava que eu tivesse a resposta certa.
- Percy - disse ele -, sua mãe não lhe contou nada?
- Ela disse... - Lembrei-me dos seus olhos tristes, olhando para o mar. - Ela me contou que tinha medo de me mandar para cá, embora meu pai quisesse que ela fizesse isso. Disse que, uma vez aqui, provavelmente não poderia sair. Queria me manter perto dela.
- Típico - disse o sr. D - É assim que eles normalmente são mortos. Rapazinho, você vai fazer um lance ou não vai?
- O quê? - perguntei.
Ele explicou, impacientemente, como se faz um lance em pinoche, e eu fiz.
- Lamento, mas há coisas demais a contar - disse Quíron. - Receio que nosso filme de orientação não seja suficiente.
- Filme de orientação? - perguntei.
- Não - concluiu Quíron. - Bem, Percy. Você sabe que seu amigo Grover é um sátiro. Você sabe - ele apontou para o chifre na caixa de sapatos - que você matou o Minotauro. E não é um pequeno feito, rapaz. O que você pode não saber é que grandes forças estão em ação na sua vida. Os deuses - as forças que você chama de deuses gregos - estão muito vivos.
Olhei para os outros em volta da mesa.
Aguardei que alguém gritasse, Não! Mas tudo o que ouvi foi o sr. D gritando:
- Oh, um casamento real. Truco! Truco! - Ele gargalhou enquanto contava os pontos.
- Sr. D - perguntou Grover timidamente -, se não for comê-la, posso ficar com sua lata de Diet Coke?
- Hein? Ah, está bem.
Grover mordeu um grande pedaço da lata de alumínio vazia e mastigou tristemente.
- Espere - eu disse a Quíron -, está me dizendo que existe algo como Deus.
- Bem, vamos lá - disse Quíron. - Deus - com D maiúsculo, Deus. Isso é outro assunto. Não vamos lidar com o metafísico.
- Metafísico? Mas você estava falando sobre...
- Ah, deuses, no plural, grandes seres que controlam as forças da natureza e os empreendimentos humanos; os deuses imortais do Olimpo. Essa é uma questão menor.
- Menor?
- Sim, muito. Os deuses que discutimos na aula de latim.
- Zeus - disse eu. - Hera. Apolo. Você quer dizer , esses. E, de novo, uma trovoada distante em um dia sem nuvens.
- Rapazinho - disse o sr. D -, se eu fosse você, seria menos negligente quanto a ficar soltando esses nomes por aí.
- Mas são historias - disse eu. –- São... mitos, para explicar os relâmpagos, as estações e tudo mais. Era nisso que as pessoas acreditavam antes de surgir a ciência.
- Ciência! - zombou o sr. D. - E diga-me, Perseu Jackson - eu me encolhi quando ele disse meu nome verdadeiro, que nunca contara a ninguém -, o que as pessoas pensarão da sua ―ciência‖ daqui a milhares de anos? Humm? Irão chamá-la de baboseiras primitivas. É isso o que irão pensar. Ah, eu adoro os mortais... ele não têm a menor noção de perspectiva. Acham que já chegaram tãããão longe. E chegaram, Quíron? Olhe para esse menino e diga-me.
- Percy - disse Quíron -, você pode escolher entre acreditar ou não, mas o fato é que imortal significa imortal. Pode imaginar isso por um momento, não morrer nunca? Existir, assim como você é, para toda a eternidade?
Eu estava prestes a responder, assim sem pensar, que parecia um negocio muito bom, mas o tom de voz de Quíron me fez hesitar.
- Você quer dizer, quer as pessoas acreditem em você ou não – disse eu.
- Exatamente - concordou Quíron. - Se você fosse um deus, gostaria de ser chamado de mito, de uma velha historia para explicar os relâmpagos? E se eu contasse a você, Perseu Jackson que um dia as pessoas vão chamar você de mito, criado apenas para explicar como menininhos podem sobreviver à perda de suas mães?
Meu coração disparou. Ele estava tentando me deixar zangado por alguma razão, mas eu não ia permitir que o fizesse. Eu disse:
- Eu não gostaria disso. Mas não acredito em deuses.
- Oh, é melhor mesmo - murmurou o sr. D. - Antes que um deles o incinere.
Grover disse:
- P-por favor, senhor. Ele acaba de perder a mãe. Está em estado de choque.
- Uma sorte, também - resmungou o sr. D, jogando uma carta. - Ruim mesmo é estar confinado a esse trabalho deprimente, com meninos que nem mesmo têm fé!
Ele acenou e uma taça apareceu sobre a mesa, como se a luz do sol tivesse momentaneamente se encurvado e transformado o ar em vidro. A taça se encheu de vinho tinto.
Meu queixo caiu, mas Quíron mal ergueu os olhos.
- Senhor D - advertiu -, as suas restrições.
O sr. D olhou para o vinho e fingiu surpresa.
- Ora vejam. - Ele olhou para o céu e gritou: - Velhos hábitos! Desculpe!
Mais trovoes.
O sr. D acenou outra vez e a taça de vinho se transformou em uma nova lata de Diet Coke. Ele suspirou, infeliz, abriu a lata e voltou ao seu jogo de cartas.
Quíron piscou para mim.
- O sr. D irritou o pai dele tempos atrás, sentiu-se atraído por uma ninfa dos bosques que tinha sido declarada inacessível.
- Uma ninfa dos bosques - repeti, ainda olhando para a Diet Coke como se tivesse vindo do cosmos.
- Sim - confessou o sr. D. - O pai adora me castigar. Na primeira vez, Proibição. Horrível! Dez anos abasolutamente terríveis! Na segunda vez... bem, ela era mesmo linda, não consegui ficar longe... na segunda vez, ele me mandou para cá. Colina Meio-Sangue. Acampamento de verão para moleques como você. ―Seja uma influencia melhor‖, ele me disse. ―Trabalhe com os jovens em vez de arrasar com eles.‖ Ah! Que injustiça.
O sr. D parecia ter seis anos de idade, como uma criancinha fazendo pirraça.
- E... - gaguejei - o seu pai é...
- Di immotales, Quíron - disse o sr. D. - Pensei que você tinha ensinado o básico a este menino. Meu pai é Zeus, é claro.
Repassei os nomes começados em D da mitologia grega. Vinho. A pele de um tigre. Os sátiros que pareciam estar todos trabalhando aqui. O modo como Grover se encolhia de medo, como se o sr. D fosse seu senhor.
- Você é Dionisio - disse eu. - O deus do vinho.
O sr. D revirou os olhos.
- Como eles dizem hoje em dia, Grover? As crianças dizem, ―fala sério‖?
- S-sim, sr. D.
- Então, fala sério, Percy Jackson. Achou o quê; que eu fosse Afrodite?
- Você é um deus.
- Sim, criança.
- Um deus. Você.
Ele se virou para olhar diretamente para mim, e vi uma espécie de fogo arroxeado nos seus olhos, um indício de que aquele homenzinho reclamão e gorducho só estava me mostrando uma minúscula parte de sua verdadeira natureza. Tive visões de vinhas estrangulando descrentes até a morte, guerreiros bêbados insanos com o entusiasmo da batalha, marinheiros gritando enquanto suas mãos se transformavam em nadadeiras, os rostos se alongando em focinhos de golfinho. Eu sabia que, se o pressionasse, o sr. D iria me mostrar coisas piores. Iria plantar uma doença no meu cérebro que me levaria a usar camisa-de-força pelo resto da vida.
- Gostaria de me testar, criança? - disse em voz baixa.
- Não. Não, senhor.
O fogo diminuiu um pouco. Ele voltou ao jogo de cartas.
- Acho que ganhei.
- Não exatamente sr. D - disse Quíron. Ele baixou uma seqüência, contou os pontos e disse: - O jogo é meu.
Achei que o sr. D fosse transformar Quíron em pó em sua cadeira de rodas, mas ele apenas suspirou pelo nariz, como se estivesse acostumado a ser batido pelo professor de latim. Pôs-se de pé, e Grover levantou-se também.
- Estou cansado - disse o sr. D. - Acho que vou tirar uma soneca antes da cantoria desta noite. Mas primeiro, Grover, precisamos conversar de novo sobre seu desempenho para lá de imperfeito nessa missão.
O rosto de Grover cobriu-se de gotículas de suor.
- S-sim, senhor.
O sr. D voltou-se para mim.
- Chalé 11, Percy Jackson. E cuidado com seus modos.
Ele se afastou para dentro da casa, com Grover o seguindo arrasado.
- Grover vai ficar bem? - perguntei a Quíron.
Quíron assentiu, embora parecesse um pouco perturbado.
- O velho Dionisio não está realmente zangado. Ele apenas detesta seu trabalho. Ele foi... ahn, confinado à Terra, pode-se dizer, e não pode agüentar ter de esperar mais um século antes de ser autorizado a voltar ao Olimpo.
- O Monte Olimpo - disse eu. - Você está me dizendo que realmente existe um palácio ali?
- Bem, agora há o Monte Olimpo na Grécia. E há o lar dos deuses, o ponto de convergência dos seus poderes, que de fato costumava ser no Monte Olimpo. Ainda é chamado de Monte Olimpo, por respeito às tradições, mas o palácio muda de lugar, Percy, assim como os deuses.
- Você quer dizer que os deuses gregos estão aqui? Tipo... nos Estados Unidos?
- Bem, certamente. Os deuses mudam com o coração do Ocidente.
- O quê?
- Vamos, Percy. O que vocês chamam de ―civilização ocidental‖. Você acha que é apenas um conceito abstrato? Não, é uma força viva. Uma consciência coletiva que ardeu brilhantemente por milhares de anos. Os deuses são parte dela. Você pode até dizer que eles são sua fonte ou, pelo menos, que estão ligados tão intimamente a ela que possivelmente não vão deixar de existir, a não ser que toda a civilização ocidental seja destruída. A chama começou na Grécia. Então, como você bem sabe... ou espero que saiba, já que foi aprovado no meu curso... o coração da chama se mudou para Roma, e assim fizeram os deuses. Ah, com nomes diferentes, talvez: Júpiter em vez de Zeus, Vênus em vez de Afrodite, e assim por diante; mas as mesmas forças, os mesmos deuses.
- E então eles morreram.
- Morreram? Não. O Ocidente morreu? Os deuses simplesmente se mudaram, para a Alemanha, para a França, para a Espanha, por algum tempo. Aonde quer que a chama brilhasse mais, lá estavam os deuses. Eles passaram vários séculos na Inglaterra. Tudo o que você precisa é olhar para a arquitetura. As pessoas não esquecem os deuses. Em todos os lugares onde reinaram, nos últimos três mil anos, você pode vê-los em pinturas, em estátuas, nos prédios mais importantes. E sim, Percy, é claro que agora eles estão nos Estados Unidos. Olhe para o símbolo do país, a águia de Zeus. Olhe para a estátua de Prometeu no Rockfeller Center, para as fachadas dos edifícios governamentais em Washington. Eu o desafio a encontrar qualquer cidade americana onde os olimpianos não estejam proeminentes expostos em vários locais. Goste ou não – e acredite, uma porção de gente não gostava muito de Roma também -, os Estados Unidos são agora o coração da chama. São a grande potencia do Ocidente. E, portanto, o Olimpo é aqui. E nós estamos aqui.
Aquilo tudo foi demais para mim, especialmente o fato de que eu parecia estar incluído no nós de Quíron, como se fizesse parte do mesmo clube.
- Quem é você, Quíron? Quem... quem eu sou?
Quíron sorriu. Ele mudou de posição, como se fosse levantar da cadeira de rodas, mas eu sabia que era impossível. Era paralítico da cintura para baixo.
- Quem é você? - ele ficou pensativo. - Bem, essa é a pergunte que todos queremos ver respondida, não é? Mas, por enquanto, temos de lhe arranjar um beliche no chalé 11. Ali haverá novos amigos para conhecer. E tempo à vontade para as aulas amanhã. Alem disso, haverá guloseimas em volta da fogueira esta noite, e eu simplesmente adoro chocolate.
E então ele se levantou da cadeira de rodas. Mas havia algo de estranho no modo como ele fez isso. A manta caiu de cima das pernas, mas elas não se moveram. A cintura foi ficando mais longa, erguendo-se acima do cinto. De início, pensei que estivesse usando roupas de baixo muito compridas de veludo branco, mas à medida que ele foi ser erguendo da cadeira, mais alto que qualquer homem, percebi que a roupa de baixo de veludo não era roupa de baixo; era a parte da frente de um animal, músculos e tendões sob um pêlo branco e áspero. E a cadeira de rodas não era uma cadeira. Era algum tipo de recipiente, uma enorme caixa sobre rodas, e devia ser mágica, porque não havia como ela contê-lo inteiro. Uma perna saiu, comprida e com joelho saliente, com um grande casco polido. Depois outra perna dianteira, depois a parte traseira, e depois a caixa ficou vazia, nada além de uma casca de metal com um par de pernas humanas acoplado.
Olhei para o cavalo que acabara de pular da cadeira de rodas: um enorme corcel branco. Mas, onde devia estar o seu pescoço, estava a parte de cima do corpo do meu professor de latim, suavemente enxertada no tronco do cavalo.
- Que alívio - disse o centauro. - Fiquei tanto tempo confinado lá dentro que minhas juntas adormeceram. Agora venha, Percy Jackson. Vamos conhecer os outros campistas.

Perfeitos Estranhos

Luce movimentou-se pesadamente para dentro de uma sala iluminada com lâmpadas fluorescentes do Colégio Sword & Cross dez minutos depois do que deveria. Um acompanhante com peito em formato de barril, bochechas vermelhas e uma prancheta presa sobre bíceps de ferro já estava dando ordens – o que significava que Luce estava atrasada.
— Então se lembrem: são remédios, camas e vermelho — o acompanhante rosnou para um grupo de três estudantes, todos de costas para Luce. — Se lembrem do básico e ninguém se machuca.
Luce escorregou rapidamente para trás do grupo. Ela ainda estava tentando descobrir se ela tinha preenchido a gigante pilha de papel corretamente, se esse guia de cabeça raspada parado na frente deles era um homem ou uma mulher, se havia alguém para ajudá-la com sua enorme bolsa de tecido, se seus pais iriam se livrar de seu amado Plymouth Fury no minuto que eles chegassem em casa, depois que a deixaram ali.
Eles vinham ameaçando vender o carro durante todo o verão, e agora eles tinham uma razão que Luce não poderia argumentar contra: ninguém podia ter um carro na nova escola de Luce. Sua nova escola reformatória para ser preciso. Ela ainda estava se acostumando com o termo.
— Você poderia, hum, você poderia repetir isso? — Ela perguntou para o acompanhante. — O que era, remédios...?
— Bem, olhe o que a tempestade trouxe — o acompanhante disse em voz alta, então continuou, enunciando devagar. — Remédios. Se você é um dos alunos medicados, é onde você deve ir para manter-se dopada, sã, respirando, ou seja lá o que for.
Mulher, Luce decidiu, estudando a acompanhante. Nenhum homem poderia ser malicioso o suficiente para dizer tudo isso nesse tom de voz zombador.
— Saquei — Luce sentiu seu estômago agitar-se — remédios.
Ela tinha se desligado dos remédios por anos agora. Depois do acidente no verão passado, Dr. Sanford, seu especialista em Hopkinton – e a razão de seus pais a mandarem para internatos lá em New Hampshire – havia considerado medicá-la mais uma vez. Embora ela o tenha convencido de sua quase-estabilidade, isso a fez ter um mês extra de análise da parte dela, só para ficar longe daqueles terríveis antipsicóticos.
Este era o motivo pelo qual ela estava se registrando em seu último ano no Colégio Sword & Cross um mês depois das aulas começarem. Ser aluno novo já era ruim o suficiente, e Luce estava nervosa o suficiente para entrar em turmas onde todos já estavam fixados. Mas pelo que parecia depois de sua excursão, ela não era a única novata chegando aquele dia.
Ela deu uma olhadinha furtiva para os outros três alunos em meio círculo em volta dela. Em sua última escola, Dover Prep, na excursão pelo campus foi onde ela achou sua melhor amiga, Callie. Em um campus onde todos os outros estudantes foram praticamente desmamados juntos, isso havia sido o suficiente que Luce e Callie fossem as duas únicas crianças sem legado. Mas não demorou muito para elas perceberem que tinham a mesma obsessão pelos mesmos filmes antigos – especialmente os relacionados com Albert Finney. Após a descoberta delas no primeiro ano enquanto assistiam Two for the Road que elas não podiam fazer um saco de pipoca sem ativar o alarme de incêndio, Callie e Luce nunca mais se separaram. Até... Até que elas tiveram que se separar.
Do lado de Luce hoje havia dois caras e uma garota. A garota era bem fácil de se enturmar, loira e com a beleza de comercial de cosméticos, com unhas bem feitas na cor rosa-pastel que combinava com sua pasta de plástico.
— Eu sou Gabbe — ela falou lentamente, lançando a Luce um grande sorriso que desapareceu tão rápido quanto surgiu, depois que Luce não disse seu próprio nome.
O desinteresse da menina lembrou-lhe mais uma versão sulista das meninas da Dover do que alguém que ela esperava na Sword & Cross. Luce não conseguia se decidir se isso era reconfortante ou não, ainda mais imaginar o que uma menina como aquela fazia numa escola reformatória.
À direita de Luce havia um garoto com cabelo castanho curto, olhos castanhos e sardas em volta do nariz. Mas o jeito que ele não olhava nos olhos dela, escolhendo cutucar a cutícula de seu polegar, deu a ela a impressão de que ele provavelmente estava atordoado e com vergonha de encontrar-se aqui.
O garoto à sua esquerda, por outro lado, preenchia a imagem da Luce deste lugar um pouco perto perfeitamente demais. Ele era alto e magro, com uma bolsa de DJ a tiracolo, cabelo preto desgrenhado, e grandes e profundos olhos verdes. Seus lábios eram carnudos e de um rosa natural que muitas garotas matariam para ter. Na parte detrás de seu pescoço uma tatuagem preta com formato de raios de sol parecia quase brilhar em sua pele clara, levantando-se a partir da borda de sua camiseta preta.
Diferente dos outros dois, quando esse cara se virou para encontrar seu olhar, ele o segurou e não deixou soltar. Sua boca foi definida em uma linha reta, mas seus olhos eram quentes e vivos. Ele a contemplava, de pé como uma escultura, que fez Luce se sentir enraizada em seu lugar também. Aqueles olhos eram intensos e sedutores, e bem, um pouco desarmantes.
Com um pigarro alto na garganta, a acompanhante interrompeu o transe. Luce corou e fingiu estar muito ocupada coçando a cabeça.
— Aqueles que entenderam o funcionamento estão livres para sair depois que deixarem aqui seus pertences de risco — a acompanhante apontou para uma grande caixa de papelão sob uma placa que dizia em grandes letras pretas MATERIAIS PROIBIDOS. — E quando eu digo livre, Todd — ela fechou a mão para baixo no ombro do garoto sardento, o que o fez pular. — Eu quis dizer dentro dos limites do ginásio, para encontrar o estudante predestinado para ser seu guia. Você — ela apontou para Luce — despeje seus pertences e fique comigo.
Quatro dos estudantes se juntaram em volta da caixa e Luce assistiu, perplexa, como os outros alunos começavam a esvaziar seus bolsos. A menina puxou um canivete suíço rosa de sete centímetros. O cara de olhos verdes relutantemente sacou uma lata de spray de tinta e um estilete. Até o infeliz Todd teve de deixar várias caixas de fósforos e um pequeno recipiente de fluído de luz.
Luce se sentiu quase estúpida por ela mesma não estar escondendo nada perigoso – mas quando ela viu os outros depositarem seus celulares dentro da caixa, ela engoliu em seco.
Inclinando-se para ler a placa de MATERIAIS PROIBIDOS mais de perto, ela viu que celulares, pagers e todos os dispositivos de rádios bidirecionais estavam estritamente proibidos. Já era ruim o suficiente que ela não poderia ter o seu carro! Luce fechou a mão suada em torno do celular em seu bolso, sua única ligação com o mundo exterior. Quando a acompanhante viu a expressão em seu rosto, Luce recebeu pequenos tapinhas na bochecha.
— Não desmaie comigo, querida. Eles não me pagam o suficiente para fazer ressucitação. Além disso, você tem direito a uma ligação telefônica por semana no átrio principal.
Uma ligação? Por semana? Mas...          
Ela olhou para seu telefone mais uma vez e viu que havia recebido mais duas mensagens de texto. Não parecia possível que essas seriam suas duas últimasmensagens de texto. A primeira era de Callie.
Me liga imediatamente! Estarei esperando ao lado do telefone a noite toda, então, esteja pronta. E se lembre do mantra que eu te ensinei: Você vai sobreviver! De qualquer forma, se isso importar, eu acho que todo mundo esqueceu sobre...
Do jeito típico de Callie, ela havia ido tão longe que o celular de Luce cortou quatro linhas da mensagem. De qualquer forma, Luce estava aliviada. Ela não queria ler sobre como todos em sua antiga escola haviam finalmente esquecido o que havia acontecido com ela. O que a fez vir parar nesse lugar.
Ela suspirou e abriu sua segunda mensagem. Era de sua mãe, que só havia aprendido a enviar torpedos há algumas semanas e que certamente não sabia sobre aquela coisa de uma-ligação-por-semana.
Querida, nós estaremos sempre pensando em você. Seja boa e tente comer proteína o suficiente. Nos falamos quando pudermos. Amor, M&P
Com um suspiro, Luce percebeu que seus pais deveriam saber. O que mais poderia explicar suas expressões elaboradas quando ela deu um tchauzinho do portão da escola essa manhã, com sua mala em mãos? No café da manhã, ela havia tentado fazer piada sobre finalmente perder esse terrível sotaque de New England que ela havia adquirido na Dover, mas os seus pais não esboçaram nenhum sorriso. Ela pensou que eles continuavam chateados com ela. Eles nunca haviam feito completamente aquela coisa de elevar a voz, então quando Luce estragou tudo, eles deram a ela o tratamento do silêncio. Agora ela entendia o estranho comportamento dessa manhã: seus pais estavam de luto pela perda de contato com sua única filha.
— Nós estamos esperando apenas uma pessoa — a acompanhante disse. — Eu me pergunto quem é.
A atenção de Luce voltou para a caixa de riscos, que agora estava transbordando de itens contrabandeados que ela não conseguia reconhecer. Ela podia sentir o cara de cabelos negros com seus olhos verdes fixos nela. Ela olhou em volta e viu que todo mundo estava com os olhos fixos. Sua vez. Ela fechou seus olhos e lentamente abriu sua mão, deixando seu celular escorregar e ganhar terreno no topo da pilha. O som de ficar completamente sozinha.
Todd e a robótica Gabbe dirigiram-se para a porta sem nada além um olhar na direção de Luce, mas o terceiro cara se virou para o acompanhante.
— Eu sou capaz de informá-la — disse ele, assentindo para Luce.
— Não faz parte do nosso acordo — a acompanhante replicou automaticamente, como se estivesse esperando esse diálogo. — Você é um novo estudante de novo – o que significa restrições de aluno novo. De volta para o nível um. Se você não gosta disso, deveria ter pensado antes de quebrar a sua condicional.
O garoto permaneceu imóvel, inexpressivo, quando a acompanhante rebocou Luce – que endureceu com o “condicional” – até o fim de um corredor amarelo.
— Mexa-se — ela incitou, como se nada tivesse acontecido. — Camas.
Ela apontou para a janela oeste de um prédio de concreto cinza. Luce podia ver Gabbe e Todd misturarem-se devagar em direção deles, com o terceiro garoto andando devagar, como se alcançá-los fosse a última coisa em sua lista de coisas a fazer.
Os dormitórios eram formidáveis e quadrados, um sólido prédio cinza cujas portas duplas não davam nada sobre a possibilidade de vida dentro delas. Uma grande placa de pedra permanecia plantada no meio do gramado morto, e Luce se lembrou do website as palavras DORMITÓRIO PAULINE esculpidas dentro dele. Parecia mais feio naquela manhã de sol confusa do que na plana foto preto-e-branca.
Mesmo nessa distância, Luce podia ver o bolor negro cobrindo a frente do dormitório. Todas as janelas estavam obstruídas por uma carreira de grossas barras de aço. Ela entortou os olhos. O que era aquele arame farpado em torno do prédio?
A acompanhante olhou para a lista, folheando o arquivo de Luce.
— Quarto sessenta e três. Deixe sua bolsa em meu escritório com o resto deles por agora. Você pode desfazer essa tarde.
Luce arrastou sua mala vermelha rumo a outras três malas pretas sem classificação. Então ela chegou a refletir sobre seu celular, onde ela costumava colocar as coisas que precisava lembrar. Mas, enquanto sua mão procurava em seu bolso vazio, ela suspirou e se comprometeu a gravar o número do quarto na memória.
Ela ainda não entendia a razão pela qual não podia ficar com seus pais; sua casa em Thunderbolt ficava a menos de uma hora da Sword & Cross. Ela havia se sentido tão bem em sua casa em Savannah, onde, como sua mãe sempre dizia, até o vento soprava preguiçosamente. O lugar mais suave da Georgia, tinha o ritmo adequado ao jeito de Luce mais do que New England nunca teve. Mas a Sword & Cross não era como Savannah. Era quase como um lugar qualquer, exceto pelo fato de ser um lugar sem vida e sem cor, onde o tribunal a havia colocado hospedada.
Ela havia escutado seu pai no telefone com o diretor outro dia, concordando em seu jeito confuso e fala de professor de Biologia, “Sim, sim, talvez seja melhor para ela ser supervisionada todo tempo. Não, não, nós não queremos interferir no seu sistema.”
Claramente, seu pai não havia visto as condições de supervisão de sua filha única. Esse lugar parecia uma prisão de segurança máxima.
— E sobre, como você disse... os vermelhos? — Luce perguntou para a acompanhante, pronta para ser liberada da excursão.
— Vermelhos — a acompanhante repetiu, apontando para um pequeno fio do teto: lentes com uma luz piscante vermelha.
Luce não havia visto isso antes, mas assim que a acompanhante apontou a primeira, ela pode notar que estavam em todo lugar.
— Câmeras?
— Muito bem — a acompanhante falou, a voz gotejando condescendência. — Nós a deixamos evidentes a fim de lembrá-los. Todo tempo, a todo momento, nós a observamos. Então, não estrague... quer dizer, se você puder evitar.
Todo o tempo, todos falavam com Luce como se ela fosse uma completa psicopata, e ela estava bem perto de acreditar que isso era uma verdade.
Por todo o verão, as memórias a vinham assustando, em seus sonhos e nos raros momentos em que seus pais a deixavam sozinha. Alguma coisa havia acontecido no chalé, e todo mundo (incluindo Luce) estava morrendo para saber exatamente o quê. A polícia, o juiz, o assistente social, haviam todos tentado forçar a verdade dela, mas ela não sabia nada tanto quanto eles. Ela e Trevor haviam brincado a tarde inteira, perseguindo um ao outro pela fileira de chalés em volta do lago, longe do resto da festa. Ela tentou explicar que essa havia sido a melhor noite de sua vida, até se tornar a pior.
Ela gastou muito tempo repassando aquela noite em sua mente, ouvindo a risada de Trevor, sentindo suas mãos em volta de sua cintura, e tentar conciliar seus instintos de que ela era realmente inocente.
Mas agora, cada regra e regulamento da Sword & Cross parecia trabalhar contra esse pensamento, parecia sugerir que ela era, de fato, perigosa e precisava ser controlada. Luce sentiu uma mão firme em seu ombro.
— Olha — a acompanhante disse — se isso a faz se sentir melhor, você está longe de ser o pior caso aqui.
Foi o primeiro gesto humano que ela demonstrou a Luce, o que a fez acreditar que ela queria fazê-la se sentir melhor. Mas... Ela havia sido mandada para cá por causa da suspeita morte do cara por quem ela era louca, e ela estava “longe de ser o pior caso”? Luce se perguntou com o que exatamente eles lidavam na Sword & Cross.
— Ok. A orientação terminou. Você está por sua conta agora. Aqui está um mapa se você precisar encontrar algo a mais. — Ela deu a Luce uma cópia de um bruto mapa desenhado à mão, então olhou para seu relógio. — Você tem uma hora até sua primeira aula, mas as minhas novelas começam as cinco, então... — ela balançou sua mão para Luce — Mantenha-se direita. E não se esqueça — ela disse, apontando para as câmeras mais uma vez — Os vermelhos estão de olho em você.
Antes que Luce pudesse responder, uma garota magra, de cabelos negros apareceu à sua frente, abanando seus dedos longos na face de Luce.
— Ooooh — a garota zombou com uma voz fantasmagórica, dançando em volta de Luce em círculos. — Os vermelhos estão de olho em vocêêêê.
— Sai daqui, Ariane, antes que eu tenha que lobotomizá-la — a acompanhante disse, embora fosse claro por seu breve, mas genuíno, sorriso que ela possuía alguma bruta afeição pela garota louca.
E estava claro que Ariane não era recíproca ao amor. Ela fez um gesto obsceno para a acompanhante, então parou na frente de Luce, a enfrentando para que ficasse ofendida.
— E só por isso — a acompanhante disse, anotando furiosamente em seu caderninho — você ganhou a tarefa de mostrar tudo em volta para a pequena Miss Sunshine hoje.
Ela apontou para Luce, que parecia qualquer coisa, menos ensolarada, com seus jeans pretos, botas pretas e top preto. Na seção do “código de vestimenta”, o website da Sword & Cross falava alegremente que enquanto os alunos tivessem bom comportamento, eles estavam livres para vestir o que quisessem, porém, com duas condições: o estilo deve ser modesto e as roupas deviam ser pretas. Muita liberdade.
A blusa de gola tartaruga que sua mãe a havia forçado a usar não fazia nada pelas suas curvas, e até sua melhor forma havia sumido: seu grosso cabelo preto, que costumava cair sobre sua cintura, havia sido completamente destruído. O fogo do chalé havia queimado seu couro cabeludo e deixado seu cabelo desigual, então depois da longa, silenciosa viagem de Dover para casa, sua mãe a colocara na banheira, trouxe o barbeador elétrico do pai e sem nenhuma palavra raspou sua cabeça. Durante o verão, seu cabelo havia crescido um pouco, apenas o suficiente para que suas ondas, outrora invejáveis, agora pairassem logo abaixo de suas orelhas.
Ariane a avaliou, dando um tapa com um dedo contra seus finos lábios pálidos.
— Perfeito — ela disse, dando um passo a frente para colocar seus braços em volta de Luce. — Eu estava realmente pensando que eu poderia usar uma nova escrava.
A porta do salão abriu e entrou o menino de olhos verdes. Ele balançou a cabeça e disse para Luce:
— Esse lugar não liga de te despir para fazer uma revista. Então, se você está guardando qualquer outro risco — ele ergueu uma sobrancelha e um punhado de objetos desconhecidos da caixa — salve-se dos perigos.
Atrás de Luce, Ariane prendia o riso. O cara virou a cabeça e quando seus olhos registraram Ariane, ele abriu sua boca e a fechou novamente, como se não tivesse certeza do que fazer.
— Ariane — ele falou uniformemente.
— Cam — ela replicou.
— Você o conhece? — Luce sussurrou, se perguntando se havia o mesmo tipo de facções em escolas reformatórias como haviam na Dover.
— Não me lembre — Ariane disse, arrastando Luce para fora da porta, dentro da cinza e alagada manhã.
Os fundos do prédio principal davam em uma calçada lascada, em volta de um campo bagunçado. A grama estava tão comprida que parecia mais um terreno baldio que uma área pública de uma escola, mas um desbotado placar e arquibancadas de madeira provavam o contrário.
Por trás do contorno do lugar, havia quatro prédios de aparência severa: o dormitório longe à direita; uma gigante, feia e velha igreja à extrema esquerda e outras duas grandes estruturas no meio deles, que Luce imaginou serem as salas de aula.
Era isso. Seu mundo inteiro estava reduzido àquela triste visão de seus olhos.
Ariane imediatamente desviou do caminho direito e levou Luce ao campo, sentando no alto de uma das arquibancadas de madeira molhadas.
A estrutura correspondente em Dover gritava Atleta da Ivy League em formação, então Luce sempre havia evitado ficar lá. Mas esse campo vazio, com essas enferrujados, deformados traves, contava uma história completamente diferente. Uma que não foi fácil para Luce descobrir. Três urubus turcos passaram acima de sua cabeça, e um vento triste chicoteou sobre os galhos nus dos carvalhos. Luce estremeceu e abaixou seu queixo para dentro da gola de tartaruga.
— Então — Ariane começou — agora você conheceu Randy.
— Eu pensei que fosse Cam.
— Eu não estou falando dele — Ariane disse rapidamente — a mulher-macho daqui. — Ariane virou a cabeça para o escritório onde elas haviam deixado a acompanhante vendo TV. — Que que 'cê acha? Homem ou mulher?
— Hm... Mulher? — Luce tentou. — Isso é um teste?
Ariane esboçou um sorriso.
— O primeiro de muitos. E você passou. Pelo menos, eu acho que você passou. O gênero da maioria do corpo docente daqui é um debate escolar em curso. Não se preocupe, você vai entrar nele.
Luce achou que Ariane estava fazendo uma piada – nesse caso, legal. Mas isso tudo era como uma enorme mudança da Dover. Em sua antiga escola, as gravatas-verdes-esgotantes, os engomados futuros senadores praticamente escorriam pelos corredores, no requintado silêncio que o dinheiro parecia passar acima de tudo.
Mais do que nunca, o pessoal da Dover lançava a Luce olhares tortos de não-suje-as-paredes-brancas-com-suas-impressões. Ela tentou imaginar Ariane lá: se espreguiçando nas arquibancadas, fazendo uma alta, bruta piada com sua voz mordaz. Luce tentou imaginar o que Callie pensaria de Ariane. Nunca havia ninguém como ela na Dover.
— Okay, desembucha — Ariane ordenou.
Pulando da arquibancada mais alta e apontando para que Luce se juntasse a ela
— O que cê fez para entrar aqui?
O seu tom de voz era brincalhão, mas de repente Luce teve que se sentar. Era ridículo, mas ela meio que esperava passar por seu primeiro dia de aula sem seu passado vindo a mente, roubando sua fina fachada de calma. É claro que as pessoas aqui vão querer saber.
Ela pôde sentir o sangue arranhar suas têmporas. Acontecia sempre que ela tentava pensar voltar – realmente voltar – àquela noite. Ela nunca parou de se sentir culpada com o que havia acontecido a Trevor, mas ela também tentava duramente não ficar atolada nas sombras que, por agora, eram a única coisa que ela se lembrava do acidente. Aquela escuridão, as coisas indefinidas que ela nunca poderia contar para ninguém.
Risque isso – ela começou a contar a Trevor a presença peculiar que sentiu naquela noite, sobre as curvas retorcidas sobre suas cabeças, tentando assombrar sua noite perfeita. É claro, então já era tarde demais. Trevor se foi, seu corpo queimado e irreconhecível, e Luce era... Ela era... Culpada?
Ninguém sabia sobre as tenebrosas formas que ela havia visto no escuro. Elas sempre vinham para ela. Elas iam e vinham há tanto tempo que Luce não conseguia se lembrar a primeira vez que as vira. Mas ela se lembrava da primeira vez que ela percebeu que as sombras não vinham para todos – ou na verdade, para ninguém além dela. Quando ela tinha sete anos, sua família estava de férias em Hilton Head e seus pais a levaram em uma passeio de barco. Estava perto do pôr-do-sol quando as sombras começaram a ondular sobre a água, e ela se virou para seu pai e disse “O que você faz quando elas aparecem, pai? Porque você não se assusta com os monstros?”
Não haviam monstros, seus pais a asseguraram, mas Luce repetia insistentemente a presença de alguma coisa oscilante e negra que a levou a várias consultas com o oftalmologista da família, e depois óculos, e depois consultas com o médico de ouvido depois dela fazer uma errônea descrição do som rouco de vento soprando forte que as sombras faziam algumas vezes – e depois, terapia, e depois, mais terapia, e finalmente a prescrição de remédios antipsicóticos. Mas nada os fazia ir embora.
Quando ela fez catorze, Luce se recusou a tomar seus remédios. Foi quando eles encontraram o Dr. Sanford e a Dover School perto. Eles voaram para New Hampshire, e seu pai dirigiu seu carro alugado por uma rodovia longa e sinuosa para a mansão no topo da colina chamada Shady Hollows. Eles colocaram Luce de frente para um homem de jaleco e a perguntaram se ela continuava tendo suas “visões”. A palma das mãos de seus pais estavam suando, enquanto eles agarravam as mãos, sobrancelhas franzidas com o medo de que houvesse algo terrivelmente errado com sua filha.
Ninguém veio e disse que se ela dissesse para o Dr. Sanford o que eles queriam que ela dissesse, ela provavelmente estaria vendo muito mais da Shady Hollows. Quando ela mentia e agia normalmente, ela estava permitida a frequentar a Dover e só tinha que visitá-lo uma vez ao mês.
Luce tinha sido permitida de parar de tomar as horríveis pílulas assim que começou a fingir que não via mais as sombras. Mas ela continuava sem ter controle sobre elas quando apareciam.
Tudo o que ela sabia era que o catálogo mental dos lugares que eles apareceram para ela no passado – florestas densas, águas turvas – se tornaram os lugares que ela evitava a todo custo.
Tudo o que ela sabia era que quando as sombras vinham, elas estavam acompanhadas de um calafrio gelado sobre sua pele, um repugnante sentimento diferente de qualquer outra coisa.
Luce sentou de pernas abertas em uma das arquibancadas e segurou suas têmporas entre seus polegares e dedos médios. Se ela queria fazer aquilo completamente hoje, ela tinha que colocar seu passado em recesso na sua mente. Ela não conseguia sondar sua memória daquela noite por ela mesma, então não havia nenhum jeito dela arejar todos os detalhes horríveis para algum esquisito, maníaco estranho.
Em vez de responder, ela observou Ariane, que estava deitada de costas para as arquibancadas, um par de enormes óculos escuros esportivos cobrindo o melhor da sua face. Era difícil afirmar, mas ela estava olhando para Luce, também, porque, depois de um segundo, ela se levantou das arquibancadas e sorriu.
— Corte meu cabelo como o seu.
— O quê? — Luce engasgou. — Seu cabelo é lindo.
Era verdade: Ariane tinha um longo, pesado cabelo, que Luce tinha perdido desesperadamente. Seus cachos negros soltos brilhavam na luz do sol, ganhando um tom avermelhado. Luce enfiou seu cabelo atrás das orelhas, mesmo que ele ainda não fosse longo o bastante para fazer qualquer coisa exceto bater de volta na frente deles.
— Linda porcaria — Ariane disse. — O seu é sexy, moderno. E eu quero ele.
— Oh, um, okay.
Seria isso um elogio? Ela não sabia se deveria estar lisonjeada ou enervada com o jeito que Ariane assumiu que poderia ter o que desejasse, até quando isso pertencia a outra pessoa.
— Onde nós vamos conseguir...
— Tcharã — Ariane abriu sua bolsa e tirou de lá o canivete suíço rosa que Gabbe havia deixado na caixa de perigos. — Que foi? — ela disse, vendo a reação de Luce. — Eu sempre mantenho meu dedo pegajoso no dia que os novos estudantes tem que se livrar dessas coisas. A ideia sozinha me veio em meus dias de cão no entretenimento da Sword & Cross... Hm... Acampamento de verão.
— Você passa o verão inteiro... Aqui? — Luce estremeceu.
— Há! Falando como uma verdadeira novata! Você provavelmente está esperando umas férias de primavera. — Ela atirou para Luce o canivete suíço. — Nós não vamos deixar esse inferno. Nunca. Agora corte.
— E as câmeras? — Luce perguntou, olhando em volta, com o canivete em mãos.
Haveria câmeras em algum lugar aqui.
Ariane sacudiu a cabeça.
— Me recuso a me associar com maricas. Você pode lidar com isso ou não?
Luce assentiu.
— E não me diga que você nunca cortou um cabelo antes. — Ariane agarrou o canivete suíço por trás de Luce, puxou a ferramenta de tesoura e entregou-o de volta. — Nenhuma outra palavra até você me dizer o quão fantástica fiquei.
No “salão” da banheira de seus pais, a mãe de Luce havia puxado os restos de seu longo cabelo em um bagunçado rabo de cavalo, antes de jogar tudo aquilo fora. Luce estava certa de que havia um método mais estratégico de cortar cabelos, mas como alguém que evitara cortes de cabelo durante toda a vida, a técnica do rabo de cavalo era a única que conhecia. Ela recolheu o cabelo de Ariane em suas mãos, pegou o elástico que estava em volta de seu pulso, segurou a pequena tesoura firmemente e começou a cortar.
O rabo de cavalo caiu nos pés dela e Ariane sobressaltou-se e apanhou subitamente. Ela o pegou e segurou na direção do sol. O coração de Luce se comprimiu com a visão. Ela estava agonizando pelo seu próprio cabelo perdido, e todas as outras perdas que isso simbolizava. Mas Ariane só deixou um delicado sorriso espalhar pelos seus lábios. Ela correu os dedos pelo rabo de cavalo, e depois o jogou dentro da bolsa.
— Maravilhoso — ela disse. — Continue.
— Ariane — Luce sussurrou, antes que pudesse parar a si mesma. — Seu pescoço. Está todo...
— Cheio de cicatrizes? Você pode dizer isso.
A pele do pescoço de Ariane, desde a parte de trás de sua orelha direita até seu colar de ossos estava com reentrâncias, marmorizadas e brilhantes. A mente de Luce foi até Trevor – para aquelas horríveis imagens. Até seus próprios pais não a olharam depois do viram. Ela estava tendo um mal momento olhando para Ariane agora.
Ariane agarrou a mão de Luce e pressionou contra sua pele. Era quente e frio, ao mesmo tempo. Era liso e áspero.
— Eu não tenho medo disso — Ariane disse. — Você tem?
— Não — Luce respondeu, enquanto ela desejava que Ariane tirasse sua mão, então Luce poderia tirar a dela também. Seu estômago se contorceu quando ela se questionou se a pele de Trevor seria assim.
— Você tem medo do que realmente é, Luce?
— Não — Luce disse outra vez, rapidamente.
Deveria ser óbvio que ela estava mentindo. Ela fechou os olhos. Tudo que ela desejava da Sword & Cross era um novo começo, um lugar onde as pessoas não olhariam para ela como Ariane estava olhando agora. No portão da escola essa manhã, quando seu pai sussurrou o lema da família em seu ouvido – “Prices nunca quebram” – parecia possível, mas agora Luce sentia-se decaída e exposta. Ela tirou sua mão.
— Então, como isso aconteceu? — ela perguntou, olhando para baixo.
— Se lembra que eu não te pressionei sobre o que você fez para estar aqui? — Ariane perguntou, erguendo suas sobrancelhas.
Luce assentiu.
Ariane gesticulou para as tesouras.
— Arrume a parte de trás, ok? Talvez isso me faça parecer realmente bonita. Talvez me faça parecer com você.
Mesmo com o mesmo corte, Ariane permaneceria como uma versão subnutrida de Luce.
Enquanto Luce estava ocupada com seu primeiro corte de cabelo, Ariane explanava as complexidades da vida na Sword & Cross.
— Esse bloco de celas ali é Augustine. É lá onde nós temos nossos tão falados eventos sociais nas noites de quarta-feira. E todas as nossas aulas.
Ela apontou para a construção com cor de dente amarelado, dois prédios à direita do dormitório. Parecia que havia sido desenhado pelo mesmo sádico que desenhara o Pauline. Era tristemente quadrado, tristemente parecido com uma fortaleza, cercado pelo mesmo arame farpado e janelas com grades. Uma névoa cinza fazia as paredes parecerem camufladas por musgos, tornando impossível de ver se alguém estava lá.
— Aviso claro — Ariane continuou — você vai odiar as aulas aqui. Você não é humana se não odiar.
— Por quê? O que há de tão ruim com elas? — Luce perguntou.
Talvez Ariane apenas não gostasse de escola no geral. Com seu esmalte preto, delineador preto e a bolsa preta que parecia grande o suficiente para caber apenas o novo canivete suíço dela, ela não parecia exatamente estudiosa.
— Aqui você vai ver o ginásio de ponta — ela disse, assumindo um tom nasalado de guia turístico. — Sim, sim, para os olhos inexperientes parece uma igreja. Costumava ser. Nós temos um tipo de arquitetura de segunda mão na Sword & Cross. Alguns anos atrás, algum maluco por exercícios físicos apareceu falando besteira sobre como supermedicar os adolescentes arruína a sociedade. Ele doou uma tonelada de dinheiro de merda então eles transformaram a igreja num ginásio. Agora os poderosos podem pensar que a gente desconta nossas “frustrações” de um jeito mais “produtivo”.
Luce gemeu. Ela sempre detestou educação física.
— Garota do meu coração — Ariane se condoeu — Treinador Diante é di-a-bó-li-co.
Enquanto Luce se movimentou para acompanhar, ela reparou no resto do recinto. O complexo da Dover havia sido bem cuidado, tudo bem feito e pontilhado em espaços uniformes, árvores cuidadosamente podadas. Sword & Cross parecia que havia tudo caído subitamente e abandonado no meio de um pântano. Salgueiros cujos galhos apontavam para baixo balançavam para o chão, kudzu crescia pelo muro em lençóis, e todo o terceiro piso escutava o barulho do respingo.
E não era apenas a maneira que o local parecia. Cada respiração úmida de Luce permanecia presa em seus pulmões. Apenas respirar na Sword & Cross fazia ela se sentir como se estivesse atolando em areia movediça.
— Aparentemente os arquitetos entraram num impasse enorme sobre como melhorar o estilo dos prédios da antiga academia militar. O resultado é que nós acabamos em um lugar metade penitenciária, metade zona de tortura medieval. E sem jardineiro — Ariane disse, tirando um pouco de limo de seus coturnos. — Tosco. Oh, e aqui está o cemitério.
Luce seguiu Ariane apontando o dedo para a parte mais longe do lado esquerdo do terreno, após o dormitório. Um manto ainda mais espesso de névoa pairava sobre a porção de terra sem muros.
Era delimitado dos três lados por uma densa floresta de carvalhos. Ela não podia ver dentro do cemitério, que parecia quase afundar-se debaixo da superfície, mas ela podia sentir o cheiro da podridão e ouvir o coro de cigarras zumbindo nas árvores. Por um segundo, ela pensou que ouviu o silvo das sombras – mas ela piscou e eles se foram.
— Isso é um cemitério?
— Aham. Isso costumava ser uma academia militar, caminho de volta nos dias da Guerra Civil. Então era aqui que eles jogavam todos os seus mortos. É arrepiante como todos caem fora. E meu sinhô — Ariane disse, acumulando um falso sotaque sulista. — Isso fede até os céus!
Então, ela piscou para Luce.
— Nós ficamos lá pra caramba.
Luce olhou para Ariane para ver se ela estava brincando. Ariane só deu de ombros.
— Okay, foi só uma vez. E foi só depois de uma grande festa de medicamentos.
Ora, essa era uma palavra que Luce reconhecia.
— Há! Ariane riu. — Eu acabei de ver uma luz acender aí em cima. Então, alguém estáem casa. Bem, Luce, minha querida, você provavelmente foi a festas de internatos, mas você nunca viu como as crianças de reformatórios colocam tudo abaixo.
— Qual é a diferença? — Luce perguntou, tentando esconder o fato que ela nunca foi a nenhuma grande festa na Dover.
— Você vai ver — Ariane parou e se virou para Luce. — Você vem essa noite e fica lá, okay? — Ela surpreendeu Luce pegando sua mão. — Promete?
— Mas eu pensei que você disse que eu devia manter distância dos casos perigosos — Luce brincou.
— Regra número dois – Não me escute! — Ariane gargalhou, balançando a cabeça. — Eu sou com certeza louca!
Ela deu uma corridinha e Luce foi atrás dela.
— Espere, qual é a regra número um?
— Me acompanha!

***

Quando elas viraram a esquina das salas de aula de paredes de bloco de cimento, Ariane deu uma parada.
— Pareça legal — ela disse.
— Legal — Luce repetiu.
Todos os outros estudantes pareciam estar agrupados em volta das árvores estranguladas pelo kudzu do lado de fora do Augustine. Nenhum deles parecia exatamente feliz por estar do lado de fora, mas ninguém parecia exatamente pronto a entrar, também.
Nunca houve muito código de vestimenta na Dover, então Luce não estava acostumada com a uniformidade do corpo estudantil. Então, novamente, apesar de todos ali usarem os mesmos jeans pretos, blusas de gola alta pretas e suéteres pretos amarrados sobre seus ombros ou em volta da cintura, continuava havendo diferenças substanciais no jeito que eles o usavam.
Um grupo de garotas tatuadas paradas em um círculo cruzado usavam pulseiras até seus cotovelos. As bandanas pretas no cabelo delas lembrou a Luce um filme que ela viu uma vez sobre gangues femininas de motocliclistas. Ela alugou porque pensou: O que pode haver de mais legal que uma gangue de motoqueiros só de mulheres? Agora os olhos de Luce trancaram-se em uma das garotas no gramado. O estrabismo lateral da garota de olhos-de-gato delineados de preto fez Luce rapidamente mudar a direção de seu olhar.
Um cara e uma garota que estavam de mãos dadas tinham lantejoulas costuradas em formato de ossos cruzados nas costas de seus suéteres pretos. A cada poucos segundos, um dos dois puxava o outro pra um beijo nas têmporas, no lóbulo da orelha, nos olhos. Quando eles envolveram seus braços em volta um do outro, Luce pode ver que ambos usavam pulseiras de rastreamento que estavam piscando. Eles pareciam um pouco rudes, mas estava óbvio o quanto estavam apaixonados. Toda vez que ela via as argolas de suas línguas piscando, Luce sentia um aperto solitário beliscando seu peito.
Atrás dos namorados, um grupo de garotos loiros estava encostado contra a parede. Cada um deles usava seu suéter, apesar do calor. E todos eles tinham camisas oxford brancas por baixo, o colarinho engomado para cima. As barras remendadas de suas calças pretas batiam na beira de seus sapatos polidos, que calçavam perfeitamente. De todos os estudantes no perímetro, esses garotos pareciam para Luce os mais próximos do estilo da Dover. Mas um olhar mais aproximado rapidamente os diferenciava dos garotos que ela costumava conhecer. Os caras como Trevor.
Apenas estando em grupo, esses garotos radiavam um tipo especial de tenacidade. Estava bem ali no olhar de seus olhos. Era difícil de explicar, mas isso de repente surpreendeu Luce, que assim como ela, todos nessa escola tinham um passado. Todos aqui provavelmente possuíam segredos que não queriam compartilhar. Mas ela não sabia se essa descoberta a fazia se sentir mais ou menos isolada.
Ariane percebeu os olhos de Luce rondando os outros alunos.
— Nós todos fazemos o que podemos para sobreviver durante o dia — ela disse, encolhendo. — Mas no caso de você não ter observado os abutres aproveitadores, esse lugar cheira muito bem a morte.
Ela tomou um lugar em um banco debaixo de um salgueiro e afagou o lugar perto dela para Luce.
Luce afastou um amontoado de folhas molhadas em decomposição, mas logo antes dela sentar, ela notou outra violação do código de vestimenta.
Uma violação muito atraente.
Ele vestia uma brilhante echarpe vermelha em volta do seu pescoço. Estava longe de estar frio lá fora, mas ele tinha uma jaqueta de couro preta de motociclista em cima de seu suéter preto, também. Talvez fosse porque ele era o único ponto de cor no perímetro, mas ele era tudo que Luce podia olhar. Na verdade, tudo parecia pálido em comparação a isso. Por um longo momento, Luce se esqueceu de quem era.
Ela notou seu cabelo dourado profundo e bronzeado apropriado. Suas maçãs do rosto salientes, os óculos escuros que cobriam seus olhos, a forma suave de seus lábios. Em todos os filmes que Luce tinha visto, em todos os livros que ela havia lido, o interesse amoroso era enlouquecedoramente bonito – exceto por aquela única pequena falha. O dente lascado, o charmoso topete, a bela marca em sua bochecha esquerda. Ela sabia por que – se o herói fosse imaculado demais, havia o risco dele ser inacessível. Mas acessível ou não, Luce sempre teve um fraco pelos sublimemente bonitos. Como esse cara.
Ele inclinou-se contra o prédio com suas mãos cruzadas suavemente sobre seu peito. E por um milésimo de segundo, Luce viu uma rápida imagem dela jogada nos braços dele. Ela sacudiu a cabeça, mas a visão permanecia tão clara que ela quase decolou em direção a ele. Não. Isso era louco. Certo? Mesmo numa escola cheia de malucos, Luce estava certa de que aquele instinto era insano. Ela nem ao menos o conhecia.
Ele estava falando com um aluno de dreads e sorriso cheio de dentes. Os dois estavam rindo forte e genuinamente – de um jeito que fez Luce se sentir estranhamente enciumada. Ela estava tentando lembrar qual foi a última vez que ela riu, realmente, daquele jeito.
— Esse é Daniel Grigori — Ariane falou, se inclinando e lendo sua mente. — Eu posso dizer que ele chamou a atenção de alguma pessoa.
— Eufemismo — Luce concordou, envergonhada quando ela percebeu como ela devia ter parecido para Ariane.
— É bem, se você gosta desse tipo de coisa.
— O que tem para não gostar? — Luce perguntou, sem conseguir fazer as palavras pararem de sair.
— O amigo dele lá é Roland — Ariane explicou, apontando na direção do garoto negro. — Ele é legal. O tipo de cara que pode conseguir coisas, sabe?
Não realmente, Luce pensou, mordendo seu lábio.
— Que tipo de coisas?
Ariane encolheu, usando seu canivete suíço roubado para cortar uma vertente desgastada de seu jeans preto.
— Apenas coisas. Tipo de coisas que você-pede-e-recebe.
— E Daniel? — Luce perguntou. — Qual é a história dele?
— Oh, ela não desiste — Ariane riu, depois limpou a garganta. — Ninguém sabe de verdade. Ele guarda bem firme sua misteriosa personalidade masculina. Pode ser simplesmente o típico babaca de reformatório.
— Eu não sou estranha a babacas — Luce disse, embora assim que as palavras saíram, ela desejou poder pegá-las de volta.
Depois do que aconteceu com Trevor – o que quer que tenha acontecido – ela era a última pessoa que deveria julgar pelas aparências. Mas, mais do que isso, nas raras vezes que ela fazia uma pequena referência àquela noite, o dossel preto das sombras se deslocava e voltava para ela, como se ela estivesse de volta ao lago.
Ela olhou de volta para Daniel. Ele tirou seus óculos e os deslizou para dentro de sua jaqueta, então, virou-se e olhou para ela.
Seu olhar apanhou o dela, e Luce viu enquanto seus olhos alargaram-se e rapidamente se estreitaram em um olhar surpreso. Quando o olhar de Daniel capturou o dela, sua respiração ficou presa em sua garganta. Ela o reconhecia de algum lugar. Mas ela iria se lembrar de conhecer alguém como ele. Ela iria se lembrar de se sentir tão absolutamente assombrada quanto se sentia agora.
Ela percebeu que eles ainda estavam com os olhos presos quando ele relampejou um sorriso para ela. Um jato de calor foi atirado nela e ela teve que agarrar-se ao banco para se apoiar. Ela sentiu os lábios dela derreteram-se num sorriso de volta para ele, mas então ele levantou sua mão no ar.
E mostrou-lhe o dedo do meio.
Luce arfou e deixou seu olhar cair.
— O quê? — Ariane perguntou, alheia ao que havia acontecido. — Esquece. Nós não temos tempo. Eu sinto o sinal.
O sinal tocou na deixa, e todo o corpo estudantil começou o lento arrastar de pés para dentro do prédio. Ariane estava segurando a mão de Luce e declamando orientações sobre onde se encontrar com ela depois e quando. Mas Luce continuava cambaleando por aquele perfeito estranho ter-lhe mostrado o dedo do meio. Seu delírio momentâneo sobre Daniel sumiu. Qual era o problema daquele cara?

Logo antes dela entrar em sua primeira aula, ela ousou olhar para trás. Seu rosto estava vazio, mas não havia dúvida – ele a estava observando ir embora.